Róger Guedes fala de conversa com Grêmio, vida no Catar e relembra fase difícil na China: 'Dos sete meses, chorei por cinco'

 

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Róger Guedes deixou o Brasil em agosto de 2023, quando se transferiu do Corinthians para o Al-Rayyan, do Catar. Desde então, vive em The Pearl, uma ilha artificial em Doha, junto de sua esposa, Sindy Guedes, de seus dois filhos, Ryan, de 9 anos, e Maya, de 2, de seus dois cachorros, Foforento e Neném, da cozinheira Flávia e da babá Ariana. Antes do treinamento no clube — que costuma ser no fim do dia —, o atacante de 29 anos abriu as portas de sua casa, já em clima natalino, e recebeu o GLOBO para uma conversa. No papo, falou sobre a negociação frustrada com o Grêmio, clubes que sonha em jogar, e relembrou a fase difícil no futebol da China durante a pandemia da Covid-19, em 2020.

Como é a sua vida no Catar?

A vida é muito tranquila, muito boa. A gente só treina um período, mais para o fim do dia. Durante o dia, eu faço meu treinamento pessoal, fico em casa, brinco um pouco com meus filhos. Saímos bastante também. É um momento que temos, que no Brasil não temos muito. Eu costumo aproveitar bastante isso aqui.

Já fala árabe fluente?

Não (risos), só algumas palavras. Só o salam alaikum, que é o cumprimento deles. E alguns palavrões também (risos), que a gente aprende com os jogadores.

Róger Guedes em entrevista exclusiva ao GLOBO

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Você acha que foi uma decisão acertada ter vindo para o Catar (Róger Guedes chegou ao Al-Rayyan em agosto de 2023)? Não pensa que ficou fora dos holofotes da seleção brasileira?

Sempre pensei em seleção brasileira. Quando eu estava no Corinthians, em 2023, era a melhor época para eu poder ter ido, mas acabei não indo. Não me arrependo nem um pouco de ter vindo para cá. A liga está crescendo muito, estamos fazendo um trabalho para crescer, como a Arábia Saudita. Estou muito feliz aqui.

Desde que você chegou ao Al-Rayyan são 66 gols em 75 jogos, sendo um dos destaques do time. Como você enxerga o futebol daqui, acha muito diferente em relação ao Brasil?

É um futebol muito dinâmico. Eu sempre brinco que aqui eu corro mais do que precisava no Brasil, em questão de quilometragem. Como aqui é mais quente, no segundo tempo o jogo fica um pouco mais aberto, então você acaba batendo e voltando muito.

Róger Guedes é um dos destaques do Al-Rayyan, do Catar

Divulgação

Fala-se muito da questão financeira no Catar, que é o país que oferece contratos longos e com valor alto. Você acha que, para você, o dinheiro é prioridade?

Não, prioridade não. Muitas pessoas falam que jogador mercenário vai para lá, para cá. Mas é como qualquer outro emprego. Você procura sempre estar ganhando mais e melhorar. E quando a gente começa a jogar futebol, não é pelo dinheiro, porque a gente começa a ganhar dinheiro depois de virar profissional. A gente joga, primeiramente, pelo amor que tem pela profissão.

No Catar costuma ter algumas premiações exorbitantes depois das partidas?

Não é nada diferente do Brasil. Acredito que no Brasil, às vezes, ainda tem um bicho um pouco maior do que aqui, em jogo de Libertadores, de Copa do Brasil. O maior bicho que tive aqui, em reais, foi R$ 50 mil. Foi só um jogo até hoje que peguei esse valor.

É comum o estádio não estar tão cheio aqui? Como você faz para se motivar com o baixo público?

Foi o que mais sofri no meu começo aqui. Às vezes, eu brinco que estava só a minha família na arquibancada. Acaba dando um pequeno desânimo, ainda mais porque eu estava no Corinthians, que em todos os jogos tinha 40, 45 mil. Uma diferença gigantesca. Mas aqui é muito bom e eu gosto do carinho dos torcedores, independentemente se você ganha ou perde.

Você prefere a pressão do Brasil ou o clima mais leve do Catar?

Eu prefiro o estádio lotado do Brasil e a (menor) pressão que tem aqui. Aqui eles sabem respeitar, acho que é muito parecido, talvez, com o futebol europeu, em que se perde um jogo e não vão invadir o estádio ou apedrejar seu carro. Mas, no Brasil, acredito que isso está mudando, porque só uma equipe vai vencer. No Brasileirão tem dez equipes tranquilamente que podem ganhar o título.

Recentemente você teve uma negociação com o Grêmio, que acabou não acontecendo. Você se frustrou por não se concretizado?

Houve uma conversa real, uma proposta oficial. Não sei se fizeram duas ou três propostas oficiais para o Al-Rayyan, mas meu presidente acabou falando não para todas elas. Não fiquei frustrado, porque tenho contrato aqui e estou feliz. Sabemos que futebol é muito dinâmico e, em toda janela, os clubes me procuram, muito pelo que faço dentro de campo.

E você pensa em voltar em algum momento para o Brasil?

Não penso isso de voltar agora ou depois, ou daqui a cinco anos, mas as pessoas me perguntam se eu quero voltar um dia, se vai ser agora. Eu deixo muito na mão de Deus. Na época, pensei que não sairia do Corinthians e acabou correndo tudo muito rápido na última semana (da janela). Futebol é muito rápido e você tem que estar preparado para tudo.

Você já passou por Atlético Mineiro, Palmeiras, Corinthians... Você acha que falta algum clube ainda no Brasil que você queira muito jogar? Na Europa tem algum que você tem vontade de jogar?

Um sonho na Europa com certeza seria o Real Madrid. Eu gostava da Roma também por causa do (Francesco) Totti. No Brasil, eu queria conquistar mais títulos mesmo. Com certeza para minha família seria um sonho um dia eu jogar no Grêmio, porque meus familiares todos são gremistas. Acredito que, para meu pai, seria um sonho, mas não é uma coisa que ele me pede.

Câmara hiperbárica na academia de Róger Guedes

Breno Angrisani

Você faz treino particular com o seu preparador físico. Quando que você começou a achar que isso precisava estar na sua rotina?

Comecei o meu trabalho com o Ramon (preparador físico) em 2020. Fiquei seis meses treinando com ele em Criciúma e decidi que queria isso para o futuro. Ele acabou não podendo ir comigo (para a China) na época por causa da pandemia, mas em 2021, quando vou para o Corinthians, levo ele para lá. Desde que comecei a trabalhar com ele, os números estão aí. Isso melhorou a minha rotina.

Róger Guedes durante uso de sua câmara hiperbárica

Breno Angrisani

Como foi passar o período na China durante a pandemia, em 2020?

Foi o período mais difícil. A gente sabe que lá tem que ser cabeça forte para não ter depressão. Tive que fazer quarentena no quarto, fiquei 14 dias no hotel trancado. Depois, no campeonato, foram seis meses em um hotel. E um mês de folga. Todo esse período longe da família. O Ryan (filho mais velho) tinha três anos na época e não falava comigo no telefone, porque achava que eu que não quis levá-lo. Eu chorava direto. Dos sete meses, eu chorei cinco fácil.

E o que você fazia para distrair a mente?

O bom é que havia muitos brasileiros. Ficaram oito times no mesmo hotel. Era um time a cada dois andares. Ficou o Guangzhou do Paulinho, do Elkeson e do Aloísio... Tinha o Renato (Augusto), o Fernandinho (Conceição)... Tinham muitos brasileiros e isso facilitou. Fazíamos jogo de pôquer no quarto para ficarmos na resenha. Isso facilitou um pouquinho, mas foi bem difícil.