
'Personal trainer do volante': como vai funcionar a nova profissão que governo quer criar com mudança na CNH

A minuta da resolução que estabelece novas normas para o acesso à Carteira Nacional de Habilitação (CNH) prevê a criação de uma "nova profissão": a do instrutor autônomo, sem vínculo obrigatório com uma autoescola — uma espécie de "personal trainer" do volante. A proposta do governo federal para desburocratizar e baratear o processo foi submetida a consulta pública até 2 de novembro, em meio a críticas de entidades do setor, que apontam riscos à segurança no trânsito e a empregos.
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O projeto prevê que o candidato, uma vez aprovado nos exames teóricos, possa combinar "livremente" a carga horária das atividades práticas com um instrutor "devidamente autorizado pelo órgão ou entidade executivo de trânsito competente". O profissional poderá ser substituído por outro "a qualquer tempo", conforme a "conveniência" do aluno, diz a minuta.
O governo federal afirma que a medida vai "ampliar as oportunidades de emprego" e permitir que os alunos tenham mais opções de como aprender a dirigir. Os profissionais interessados deverão obter a Carteira de Identificação Profissional de instrutor autônomo, que será disponibilizada gratuitamente no site da Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran), e cumprir alguns requisitos:
Ter no mínimo 21 anos de idade;
Ter concluído o Ensino Médio;
Ter habilitação para a condução de veículo há pelo menos 2 anos;
Possuir certificado de curso específico realizado pelo órgão executivo de trânsito;
Não ter cometido nenhuma infração gravíssima nos últimos 60 dias;
Não ter sofrido penalidade de cassação da CNH.
Depois de realizar o curso de formação, o instrutor precisa ser autorizado pelo Detran para exercer a atividade. Com o aval, ele terá o nome registrado junto ao Ministério dos Transportes, e seus alunos poderão verificar pela internet se o profissional está devidamente apto para ser contratado. O próprio instrutor será responsável por registrar e validar as atividades realizadas, confirmando oficialmente a participação do aluno, destaca o governo federal.
Os instrutores que atualmente são contratados por uma autoescola já são registrados no sistema — pelo novo modelo, poderão seguir normalmente com as atividades e, em paralelo, trabalhar de forma autônoma.
A proposta prevê que o instrutor deverá orientar o candidato "na definição das habilidades a serem exercitadas nas aulas, considerando seu perfil de condução, suas necessidades de aprendizagem e os critérios de avaliação previstos para o exame de direção veicular".
O veículo utilizado nas aulas poderá ser disponibilizado pelo instrutor de trânsito ou pelo próprio aluno, contanto que observe alguns requisitos estipulados na resolução, como bom estado de conservação, limite de até 12 anos de fabricação e identificação visual clara do uso para aprendizagem. Não é obrigatório que o carro tenha pedal duplo nem que seja de câmbio manual.
Conforme a minuta, as aulas práticas só poderão ocorrer após expedição da Licença de Aprendizagem Veicular e nos termos, horários e locais estabelecidos pelo órgão ou entidade de trânsito responsável. Os instrutores estarão sujeitos a ações de fiscalização e, nas inspeções, deverão apresentar os documentos obrigatórios: CNH; Credencial de Instrutor ou crachá fornecido pelo órgão competente; Licença de Aprendizagem Veicular; e Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo.
A minuta prevê que, independentemente de realizar previamente alguma aula prática, o aluno aprovado no exame teórico já poderá agendar a realização do exame de direção veicular — a etapa final para obter a permissão para dirigir.
Já para as carteiras C, D e E, a minuta prevê carga horário de dez horas para aulas práticas, a serem realizadas junto a autoescolas ou entidades ligadas ao Serviço Nacional de Aprendizagem. Cumprida esta etapa, os candidatos então poderão agendar a prova prática.
Exame prático
O projeto também prevê que, a partir da aprovação nos exames teóricos, "independentemente da realização prévia de aulas práticas de direção veicular, o candidato poderá agendar a realização do exame de direção veicular, destinado a avaliar as habilidades do candidato na condução do veículo".
Esse exame tem por finalidade "indicar se o candidato reúne as condições indispensáveis para a condução segura do veículo em vias terrestres", detalha a minuta, e será aplicado pelo órgão ou entidade executivo de trânsito com circunscrição sobre o local de residência ou domicilio indicado pelo candidato no Registro Nacional de Carteira de Habilitação (Renach).
No exame de direção veicular, o candidato deverá conduzir o veículo por um trajeto previamente definido pelas autoridades. O aluno será acompanhado por um representante do órgão ou da entidade de trânsito competente que deverá transmitir as instruções necessárias à execução do trajeto estabelecido, zelar pela segurança do motorista e dos outros usuários da via e também registrar as ocorrências relevantes para subsidiar a avaliação de uma comissão examinadora.
"A avaliação do exame caberá exclusivamente à comissão de exame de direção veicular, designada pelo órgão ou entidade executivo de trânsito competente, composta por três membros, sendo que pelo menos um deles deverá possuir habilitação na categoria igual ou superior à pretendida pelo candidato", diz a minuta.
O exame poderá ser submetido a monitoramento eletrônico, por meio de tecnologias de imagem, áudio, georreferenciamento, telemetria, sensores, dentre outros, para aferir "o cumprimento dos critérios de avaliação e a subsidiar a decisão da comissão examinadora". Quando houver o registro, o candidato terá direito a acessar as informações eletrônicas e usá-las, inclusive, para contestar os resultados.
"Quando adotado o monitoramento eletrônico, a comissão de exame de direção veicular poderá realizar a avaliação de forma remota, desde que assegurado o acesso às informações necessárias, na forma disciplinada pelo órgão máximo executivo de trânsito da União", destaca o texto.
Para realizar o exame, o candidato poderá usar veículo disponibilizado pelo órgão de trânsito ou apresentar ele mesmo um veículo, inclusive de propriedade de terceiros — "a critério do órgão ou entidade executivo de trânsito competente", diz a minuta (neste caso, se houver monitoramento eletrônico, os equipamentos deverão ser instalados no local de realização da prova). O automotor deverá atender às condições de circulação e segurança do Código de Trânsito Brasileiro e normas complementares do Contran.
Nota de 0 a 100
No exame prático, o candidato terá nota de zero a cem. Ele iniciará a prova com o valor total e terá descontados pontos para cada infração de trânsito que cometer. Para ser aprovado, o motorista deverá ter aproveitamento mínimo de 90 pontos.
Cada irregularidade ao volante valerá um ponto, mas será multiplicada pelo peso da gravidade da infração — de um a quatro. Veja:
I - peso um: infração de trânsito de natureza leve;
II - peso dois: infração de trânsito de natureza média;
III - peso três: infração de trânsito de natureza grave; e
IV - peso quatro: infração de trânsito de natureza gravíssima.
A decisão final sobre o resultado caberá "exclusivamente" à comissão de exame de direção veicular, será lançado no Renach após a avaliação e será comunicado ao candidato. Quem for reprovado poderá tentar de novo até alcançar a aprovação. O projeto admite a possibilidade, inclusive, de o candidato realizar uma nova tentativa no mesmo dia, desde que o órgão ou entidade de trânsito tenha capacidade para atender essa demanda. A alternativa não vale para quem for eliminado no exame.