Investigação sobre Filipe Martins traz dados divergentes sobre registros de entrada nos EUA; veja a cronologia do caso

 

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A Polícia Federal pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) a abertura de uma investigação para apurar se houve uma simulação de entrada de Filipe Martins, ex-assessor de Jair Bolsonaro na Presidência, nos Estados Unidos em dezembro de 2022. A solicitação foi o movimento mais recente do caso que rendeu a prisão de Martins por seis meses.

Abaixo, O GLOBO traz a cronologia dos acontecimentos, as alegações da acusação, as explicações da defesa e as decisões de Moraes ao longo do processo.

Nome na lista x negativa do órgão de fronteiras

A PF não acusa diretamente Martins, mas aponta que pode ter ocorrido uso indevido de prerrogativas diplomáticas para inserir seu nome em um procedimento migratório especial, sem presença física, e que isso precisa ser investigado.

O nome de Martins apareceu em uma lista de passageiros da comitiva presidencial que viajou para Orlando e em um registro do governo americano, mas a Alfândega e Proteção de Fronteiras (CBP, na sigla em inglês), órgão de fronteiras dos EUA, negou posteriormente que ele tenha ingressado no país.

A suposta viagem foi um dos elementos usados para justificar a prisão preventiva de Martins, decretada em fevereiro de 2024 e mantida por cerca de seis meses. A PF alegava risco de fuga, mas, segundo a defesa, ele estava residindo normalmente em Ponta Grossa (PR), com endereço fixo, contas em seu nome e movimentações financeiras regulares.

Segundo os advogados, a prisão foi ilegal e abusiva, e o delegado responsável agiu com “conduta ultrajante”, tentando criminalizar a advocacia e o contraditório. A defesa também contesta o uso do termo “milícia digital” no relatório da PF, e afirma que a localização de Martins era sabida meses antes da prisão.

Em resposta ao pedido de esclarecimentos feito pelo ministro Alexandre de Moraes, a PF sugeriu a abertura de um procedimento específico para investigar a possível fraude no registro migratório. A defesa, por sua vez, afirma que a lista oficial de passageiros do voo presidencial não inclui o nome de Martins e que ele realizou um voo doméstico para o Paraná no dia seguinte à suposta viagem. Os advogados também informaram que pediram a abertura de uma investigação nos Estados Unidos para apurar o uso indevido de dados migratórios e possíveis violações de acordos bilaterais e de privacidade.

Procurada, a defesa de Martins afirmou que ele foi vítima de "omissões que levaram à prisão ilegal e abusiva". Moraes e a Polícia Federal não fizeram comentários.

30 de dezembro de 2022 — Suposta entrada nos EUA

O que a PF alega:

A PF afirma que Martins apareceu em uma lista de passageiros que estariam a bordo do avião presidencial com destino a Orlando, em 30 de dezembro de 2022. Essa informação foi obtida a partir de um arquivo digital apreendido com Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro

Um registro de entrada foi identificado no sistema do Departamento de Segurança dos EUA, com uso do passaporte de Martins

O que a defesa diz:

Martins não viajou aos EUA e estava no Paraná na data

O registro migratório é falso

A defesa afirma que a lista oficial de passageiros do voo presidencial, divulgada pela Força Aérea Brasileira, não inclui o nome de Filipe Martins. Segundo os advogados, essa lista é pública desde janeiro de 2023

Ele fez um voo doméstico para o Paraná no dia seguinte

8 de fevereiro de 2024 — Prisão preventiva

O que a PF alega:

A prisão foi decretada com base no risco de fuga, sustentado pelo suposto registro migratório.

Martins é investigado por participação na elaboração de uma minuta golpista.

O que a defesa diz:

A prisão foi injusta e abusiva.

Martins residia em Ponta Grossa (PR), com endereço fixo e movimentações financeiras regulares.

A PF já sabia da localização dele por dados de geolocalização.

Agosto de 2024 — Soltura por Moraes

O que Moraes determinou:

Moraes mandou soltar Filipe Martins em 9 de agosto de 2024.

A decisão seguiu parecer da PGR, que apontou ausência de provas de que ele saiu do país.

Moraes considerou que a prisão não era mais adequada nem proporcional.

Medidas cautelares impostas:

Uso de tornozeleira eletrônica.

Proibição de sair da comarca e do país.

Cancelamento do passaporte.

Proibição de usar redes sociais e portar armas.

Proibição de contato com Bolsonaro, Mauro Cid e outros investigados.

O que a defesa apresentou:

Comprovantes de Uber, iFood e faturas de cartão mostrando que ele não havia deixado o Brasil e tinha residência no país

Dados de geolocalização do celular, que indicavam permanência no Brasil.

Outubro de 2025 — Novo pedido de investigação

O que a PF alega:

Sugeriu a abertura de um novo procedimento investigativo sobre a suposta entrada nos EUA.

Reforçou a hipótese de simulação dolosa com uso de prerrogativas diplomáticas.

O CBP, orgão americano de fronteiras, negou oficialmente que ele tenha ingressado nos EUA.

A PF suspeita de uso indevido de prerrogativas diplomáticas para simular a entrada.

A estratégia seria criar incerteza sobre o paradeiro de Martins e descredibilizar provas, em linha com a atuação da “milícia digital”.

O que a defesa diz:

Reitera que Martins não saiu do país.

Abriu investigação nos EUA sobre uso indevido de dados migratórios.

Alega violação de privacidade e acordos bilaterais.

O que pesa contra Filipe Martins?

Filipe Martins é réu no núcleo 2 da trama golpista investigada pelo Supremo Tribunal Federal. Segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), ele é apontado como um dos responsáveis pela elaboração da chamada “minuta do golpe”, documento que previa medidas como a prisão de ministros do STF e do presidente do Senado, além da anulação do resultado das eleições de 2022.

A Polícia Federal e a PGR o acusam de cinco crimes: organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado.

A atuação de Martins como articulador central do núcleo 2 foi mencionada por testemunhas como o tenente-coronel Mauro Cid, que afirmou que Martins apresentou a minuta golpista a Jair Bolsonaro e participou de reuniões com os comandantes das Forças Armadas.

O que a defesa diz:

Martins nega qualquer envolvimento com a minuta golpista e afirma que nunca participou de reuniões sobre o tema.

Classifica o documento como uma “minuta fantasma” e contesta a delação de Mauro Cid.

Alega que nunca teve agendas convergentes com outros réus, como o ex-ministro Anderson Torres, e que não participou de articulações golpistas.