Olho na Copa: Reencontro com a seleção brasileira após 20 anos renova esperança do Haiti em meio à crise humanitária
É fato que a classificação histórica para disputar uma Copa do Mundo após 52 anos foi o principal momento vivido pela seleção do Haiti nos últimos 20 anos. No entanto, pode-se dizer também que o confronto contra o Brasil entrará forte na disputa pelo primeiro lugar deste ranking.
A partida que será disputada no Lincoln Financial Field, na Filadélfia, às 22h do dia 19 de junho, permitirá que os haitianos assistam seus representantes no maior palco do futebol mundial contra o time mais amado e admirado do país. E muito desse carinho da população do Haiti se dá pela gratidão do povo caribenho pelo “Jogo da Paz” disputado em 2004.
Seleção brasileira chega para Jogo da Paz entre Brasil e Haiti em Porto Príncipe
Fernando Maia
Jogo da Paz entre Brasil e Haiti em Porto Príncipe
Fernando Maia
— Para a seleção haitiana, enfrentar o Brasil na Copa do Mundo é muito mais do que uma simples partida: é um evento histórico e profundamente simbólico. O Brasil sempre foi a seleção mais admirada no país. É uma das duas seleções estrangeiras com a maior torcida no Haiti. Todos ainda se lembram da atmosfera excepcional de 2004, quando os Granadeiros enfrentaram a seleção (brasileira) em um amistoso em Porto Príncipe — lembrou Childo Geffrard, do Haiti-Tempo, veículo haitiano especializado em esportes.
Confiança renovada
É difícil imaginar um cenário em que o Haiti proporcione dificuldades ao Brasil, devido à diferença técnica entre os plantéis disponíveis aos respectivos treinadores. Mesmo assim, o panorama atual entre os haitianos é de entusiasmo e confiança renovada.
Após um período de críticas ao técnico francês Sébastien Migné pela campanha decepcionante da seleção na Copa Ouro — última colocada do grupo D com apenas um empate e duas derrotas — e pela goleada por 5 a 1 sofrida para Curaçao nas Eliminatórias da Concacaf, o time conseguiu dar a volta por cima para garantir a ida ao Mundial do ano que vem. Foram seis vitórias, dois empates e duas derrotas na campanha da classificação.
O time aposta na ofensividade através da verticalidade, com transições rápidas e muitas jogadas pelas alas. Os laterais Josué Casimir e Duke Lacroix, e os pontas Deedson Louicius e Ruben Providence, são os principais responsáveis por entregar esse dinamismo. Duckens Nazon, centroavante de 31 anos formado pelo Wolverhampton, da Premier League, é a principal esperança de bolas na rede. Segundo maior artilheiro da história da seleção haitiana, com 44 gols, o camisa 9 marcou seis vezes e deu duas assistências nas Eliminatórias. Além disso, Jean-Ricner Bellegarde, meio-campista titular do próprio Wolverhampton, é o cérebro da equipe.
Cérebro do Haiti, Jean-Ricner Bellegarde marcou um gol pelo Wolverhampton contra o Manchester United
Darren Staples / AFP
Na marcação, a ideia é presar pela coesão e pela entrega tática de todos os setores. Capitão do time, Johny Placide transmite segurança debaixo das balizas. Xerife, Ricardo Adé, destaque da LDU-EQU e do futebol sul-americano, é uma das principais referências da equipe.
Recomeço social
Até a distância geográfica entre o povo haitiano e o técnico Sébastien Migné, que antes já foi um problema, se tornou um pormenor em meio aos bons resultados da seleção. Impedido de entrar no país devido à violência na capital em Porto Príncipe, controlada por gangues e tomada pela crise humanitária e de segurança pública — o cancelamento de voos internacionais faz com que o Haiti tenha que mandar suas partidas em Curaçao e não possa contar com atletas que atuem no futebol local —, Migné e seus comandados deram aos torcedores um novo motivo para sonhar e ter esperança de um novo começo, tanto no âmbito esportivo quanto simbólico.
— Os bons resultados nas fases finais das eliminatórias melhoraram a imagem dele (Migné) perante o público. Ainda existe certa sensibilidade em relação às escolhas da Federação, que muitas vezes favoreceram técnicos franceses, uma questão delicada devido ao passado colonial e à facilidade de comunicação. (Mas) a classificação conquistada inteiramente fora de casa fortaleceu os laços entre torcedores, comissão técnica e jogadores — concluiu Geffrard.
