Mistério da resistência: estudo revela como o 'Templo de Vênus' sobreviveu por dois milênios
Um novo estudo conduzido por pesquisadores da Universidade de Nápoles Federico II lança luz sobre o enigma da longevidade do chamado Templo de Vênus, em Baiae, no sul da Itália, publicado neste mês de novembro. A estrutura octogonal, construída no século II por ordem do imperador Adriano, permanece de pé há quase 2.000 anos em uma das áreas geologicamente mais ativas do país.
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Segundo a autora da pesquisa, a geóloga Concetta Rispoli, os romanos tinham domínio preciso sobre os materiais vulcânicos utilizados — e os aplicavam de forma estratégica para garantir a durabilidade do monumento, como relatado ao Daily Mail.
A engenharia por trás da sobrevivência
Erguido como parte de um amplo complexo de banhos públicos, o edifício funcionava originalmente como um grande salão termal. Localizado nos Campos Flégreos, região marcada pelo bradissismo — o constante movimento de ascensão e subsidência do solo causado pela atividade vulcânica —, o monumento permaneceu “notavelmente estável” mesmo após o terreno ao redor ter afundado cerca de seis metros ao longo dos séculos
. As características químicas dos materiais usados parecem explicar o fenômeno: “O templo permaneceu de pé porque seus materiais geológicos se comportam quase como uma rocha natural”, afirmou Rispoli.
A equipe examinou nove amostras retiradas da estrutura, incluindo argamassa, tijolos, pedras vulcânicas e eflorescências. Microscópios de alta precisão e análises por raios X permitiram identificar a composição de cada material. Os cientistas descobriram que os tijolos e argamassas eram misturas à base de cal combinadas com partículas vulcânicas dos Campos Flégreos — uma escolha considerada intencional.
Em contato com a cal, essas partículas desencadeavam reações químicas que, com o tempo, formavam novos minerais, reforçando a estrutura e aumentando sua resistência à água, à umidade e aos tremores constantes da região.
Entre os componentes mais relevantes está a pozolana, uma cinza vulcânica fina amplamente utilizada pelos romanos. Ela não era apenas um material de enchimento, mas um agente essencial para criar argamassas densas e duradouras. Já a escória — rocha vulcânica leve típica da região do Vesúvio — era empregada nas partes superiores do edifício, reduzindo o peso total da construção. Em contraste, tufos mais densos e lavas resistentes eram aplicados nas bases de sustentação, como detalhou Rispoli ao Daily Mail.
Embora conhecido como Templo de Vênus, o edifício não tinha função religiosa. Pesquisadores explicam que se tratava do “natatio”, o grande salão de piscinas do complexo termal imperial de Baiae, usado para banhos, sociabilidade e tratamentos médicos. A associação com a deusa surgiu apenas no século XVI, após a descoberta de uma estátua no local.
No artigo publicado na revista Geoheritage, os autores afirmam que o estudo reforça o alto nível técnico alcançado pelos romanos. Para eles, a seleção criteriosa de materiais, a inovação na produção de argamassas e o domínio sobre o comportamento geológico da região explicam a capacidade desses construtores de erguer monumentos que atravessam os séculos. A influência arquitetônica romana permanece evidente até hoje em estradas, aquedutos, muralhas e templos espalhados pela Europa e pelo Mediterrâneo.
O monumento também ajuda a iluminar o legado de Adriano, imperador que governou de 117 a 138 d.C. Conhecido por suas viagens pelo vasto território do Império Romano e por obras de grande impacto, como a muralha que leva seu nome no norte da Inglaterra, ele ficou marcado pelo interesse em engenharia, artes e urbanismo. Seu governo, porém, foi descrito por contemporâneos como enigmático e por vezes autoritário, mesclando boas obras, excentricidades e episódios pessoais controversos.
