Cassação de Zambelli avança na Câmara após manobra do Centrão que redefiniu votação na CCJ
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara avançou nesta quarta-feira no processo que pode levar à cassação da deputada Carla Zambelli (PL-SP), mesmo após o relator Diego Garcia (Republicanos-PR) apresentar voto pela preservação do mandato da parlamentar, que está foragida na Itália. A expectativa na Casa é que o plenário analise o caso ainda hoje. O placar da CCJ encerrou em 32 votos a 27 contra Zambelli, revertendo o parecer.
A sessão foi marcada por uma manobra silenciosa do Centrão, decisiva para isolar a deputada bolsonarista. Minutos antes da votação, o União Brasil promoveu uma troca em massa de integrantes: seis titulares do colegiado foram substituídos, entre eles nomes de direita como Alfredo Gaspar (AL) e Marcelo Freitas (MG), que deram lugar a parlamentares alinhados à articulação governista, como Moses Rodrigues (CE) e Pedro Lucas Fernandes (MA). A movimentação escancarou que, apesar do discurso público de neutralidade, líderes do Centrão não se dispuseram a assumir o desgaste de votar com Zambelli.
A deputada, presa em Roma desde julho após ter seu nome incluído na difusão vermelha da Interpol por esgotamento de recursos na ação penal sobre a invasão ao sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), participou da sessão de forma remota e se disse “perseguida”. Seu filho, João Zambelli, acompanhou a reunião presencialmente.
— O ministro Alexandre de Moraes me perseguiu. Peço votos contra a minha cassação por defesa da separação dos Poderes. Sou uma bem-aventurada por padecer pela Justiça. Sou inocente — afirmou.
A decisão do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), de enviar o caso à CCJ, e não aplicar a cassação diretamente pela Mesa Diretora, como defendiam setores da base governista, prolongou o rito, ampliou o espaço de defesa e redistribuiu o desgaste político entre o colegiado e o plenário.
O presidente do colegiado, Paulo Azi (União-BA), antes de concluir a votação afirmou que a comissão seguiu todos os trâmites e respeitou as prerrogativas da parlamentar:
— Todos os debates e embates foram feitos de forma mais absoluta e com respeito. A decisão será submetida ao plenário e a todos os parlamentares e na avaliação de cada um.
O voto do relator e o embate político
Antes da votação, Diego Garcia fez um discurso veemente contra o deputado Lindbergh Farias (PT-RJ), que havia anunciado que recorreria ao STF caso o parecer favorável à deputada fosse mantido. Garcia apresentou uma nova versão do relatório e reforçou o argumento de que o processo no Supremo não teria provas suficientes.
— A palavra final é do Congresso. É inaceitável o mandado de segurança do Lindbergh. Todas as provas contra a deputada foram mantidas sob sigilo. Conseguimos acesso aos documentos e trago, no voto, o retrato de que Carla Zambelli foi condenada sem provas conclusivas. A única prova é o depoimento do hacker Walter Delgatti, que a própria Polícia Federal chama de mentiroso — disse.
No parecer, o relator sustenta não ter encontrado “elementos conclusivos” que comprovem a participação direta da deputada nas invasões ao CNJ:
— Encontrei suspeitas, mas não certezas. A acusação se baseia apenas no depoimento de Delgatti — afirmou.
A posição de Garcia, porém, destoa das manifestações da Procuradoria-Geral da República (PGR) e do próprio Supremo Tribunal Federal (STF).
Defesa tenta evitar desgaste na Itália; base governista reage
O advogado de Zambelli, Fábio Pagnozzi, afirmou que uma eventual derrubada da cassação pelo plenário seria utilizada para demonstrar às autoridades italianas que ela não foi repudiada pelo próprio Parlamento:
— Há pessoas, inclusive do partido dela, que querem vê-la cassada apenas para tomar seu mandato. Seria importante mostrar à Justiça italiana que ela não foi cassada pelos seus pares.
A deputada Maria do Rosário (PT-RS) rebateu:
— Liberar Carla Zambelli é premiar quem atacou as urnas. Quem a colocou nessa posição vulnerável foi ela mesma e o bolsonarismo — disse.
No relatório, Garcia cita o depoimento de Michel Spiero, assistente técnico da defesa, que não encontrou arquivos nos dispositivos da deputada que a ligassem diretamente às invasões. Também menciona contradições de Delgatti, que dizia resetar o celular diariamente e não preservar conversas.
A PGR, porém, aponta que Zambelli e Delgatti atuaram juntos na criação e disseminação de um mandado de prisão falso contra Alexandre de Moraes — e que 16 documentos falsos foram inseridos no sistema do CNJ. A Procuradoria também afirma que arquivos encontrados com Zambelli eram idênticos aos do hacker, e que ela acessou um dos documentos segundos após sua criação.
Garcia ainda reproduziu trechos de depoimento do ex-servidor do TSE Eduardo Tagliaferro, segundo o qual haveria “tratamento direcionado” no Judiciário, com mensagens internas alusivas a “monitoramento” da deputada, como “vamos pegar ela!”.
