Caixas de cerveja e ligação para juiz: a condenação que fez secretário de Castro pagar R$ 300 mil para evitar prisão

 

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Secretário de governo de Cláudio Castro (PL) no Rio, o ex-deputado André Moura (União) se movimenta para concorrer ao Senado por Sergipe, em 2026, após um acordo em que conseguiu extinguir uma pena de oito anos de prisão. Moura, que é um dos principais aliados do presidente afastado da Assembleia Legislativa (Alerj), Rodrigo Bacellar, foi barrado nas últimas eleições devido a uma condenação do Supremo Tribunal Federal (STF) por usar recursos da prefeitura de Pirambu (SE) para custear despesas pessoais. A lista de gastos incluiu a compra de bebidas alcoólicas e o uso de linhas telefônicas.

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A condenação, em 2021, deixou Moura inelegível pelo prazo de oito anos após o cumprimento da pena. Em 2023, no entanto, Moura firmou um acordo de não persecução penal, no qual se comprometeu a devolver cerca de R$ 300 mil à prefeitura de Pirambu para “reparar os danos causados pelos crimes por ele perpetrado”.

O STF declarou extinta a punibilidade de Moura em maio deste ano, e desde então ele vem afirmando que “não há nenhum impedimento jurídico” para concorrer ao Senado no ano que vem. Em entrevistas, Moura também tem declarado que os processos “foram arquivados”, sem mencionar o pagamento da multa e a admissão de crimes. Procurado pela reportagem, o secretário de Castro não respondeu.

O caso de Moura foi julgado pelo STF porque ele tinha foro privilegiado, como deputado federal, quando o processo começou. Um inquérito do Ministério Público de Sergipe identificou que o município de Pirambu cobriu gastos pessoais de Moura entre 2005 e 2007, depois que se encerrou seu mandato como prefeito.

Segundo o MP, estabelecimentos contratados para fornecer alimentos à prefeitura emitiam notas fiscais “maquiadas” com itens da cesta básica, mas na verdade entregavam outras mercadorias em endereços de Moura. A manobra foi constatada, de acordo com o inquérito, em comprovantes de retirada desses itens, assinados por assessores de Moura, e que registravam as verdadeiras mercadorias.

Um desses comprovantes, por exemplo, trazia a menção a “5 caixas de cerveja” e a frase “desfile casa A.M.”, as iniciais de Moura. A retirada da mercadoria, no dia 7 de setembro de 2006, foi assinada por Lara Ferreira, esposa do então deputado. Há outros registros a compras de cerveja e mais bebidas alcoólicas, no mesmo período, para “cavalgadas promovidas com o claro propósito de promover politicamente André Moura, seus familiares e aliados”.

Outra prova que ligou Moura aos desembolsos da prefeitura de Pirambu foi a gravação de um telefonema no qual o então deputado conversava com um integrante do Tribunal de Contas do Estado (TCE-SE), em março de 2007. A ligação foi obtida graças a uma quebra de sigilo determinada na Operação Navalha, que investigou desvios de recursos em licitações no governo do Sergipe, e que atingiu membros do tribunal.

Na ligação, de acordo com o inquérito, Moura agradeceu ao conselheiro Flávio Conceição, do TCE, pela “‘vitória’ obtida em julgamento de processo no Tribunal Regional Eleitoral de Sergipe”. A ligação foi feita de uma linha de celular que, conforme os registros, era paga pela prefeitura de Pirambu, embora Moura já fosse deputado.

A defesa de Moura argumentou, no processo, que as testemunhas que apontaram a “maquiagem” nas notas fiscais de mercados voltaram atrás em novos depoimentos, e que o então deputado “havia feito a portabilidade” do número de celular que usava como prefeito de Pirambu. A maioria dos ministros do STF, no entanto, entendeu que as acusações contra Moura estavam “lastreadas em contundente acervo probatório” mesmo com o recuo das testemunhas, e que o ex-deputado só conseguiu provar a transferência do celular para seu nome em período após a ligação gravada.

O voto que levou à condenação de André Moura foi do ministro Nunes Marques, que foi seguido pela maioria e venceu o relator, Gilmar Mendes, que votava pela absolvição.

Chapa ao Senado

Por estar inelegível, Moura desistiu de concorrer em 2022 e optou, após aquela eleição, por retornar à secretaria de representação do Rio em Brasília, nomeado pelo governador Cláudio Castro. Ele havia ocupado o mesmo cargo pela primeira vez no governo de Wilson Witzel.

Já no ano passado, Castro remanejou Moura para ocupar a Secretaria de Governo, cargo de articulação entre o Palácio Guanabara e prefeituras fluminenses. Apesar da nova atribuição, Moura manteve a rotina de viajar aos fins de semana para Sergipe, onde articula o apoio de prefeitos e parlamentares para disputar o Senado.

Na semana passada, ele posou para uma foto com o senador Alessandro Vieira (MDB-SE) e com o governador de Sergipe, Fabio Mitidieri (PSD), ambos candidatos à reeleição, em um encontro que sinalizou a montagem da chapa governista para 2026.

A aliança, costurada por Mitidieri, ainda gera desconforto para os dois postulantes ao Senado. Vieira se elegeu em 2018, quando Moura também tentou o cargo de senador e acabou fora, na terceira colocação. Nesta semana, Vieira, que é o relator da CPI do Crime Organizado no Senado, convocou o presidente afastado da Alerj, Rodrigo Bacellar, para depor à comissão. No requerimento, Vieira disse que a presença de Bacellar é necessária para apurar a “ameaça representada pela infiltração econômica do crime organizado”. Bacellar, que chegou a ser preso, é investigado pelo vazamento de uma operação da PF contra o deputado TH Joias (MDB), acusado de ligação com o Comando Vermelho.

Vieira avalia que a convocação de Bacellar não interfere na aliança de Moura em Sergipe — o ex-deputado é apontado como um dos articuladores da votação realizada pela Alerj, na segunda-feira, que revogou a prisão de Bacellar. Por nota, Vieira diz "que a CPI tem a missão de apresentar uma radiografia completa da atuação do crime organizado no Brasil, em particular sua infiltração nos poderes. Neste sentido, é impossível fazer um trabalho sério sem olhar com atenção para o Rio de Janeiro. Sobre a montagem de chapa do estado, ele conclui que esta "corresponde à compreensão do governador e seu grupo de que são os dois nomes que melhor podem representar Sergipe, mesmo com perfis absolutamente diferentes."