Uso de drogas na rua 'sempre aconteceu e vai continuar acontecendo', diz Tarcísio sobre dispersão de usuários da Cracolândia

 

Fonte:


O governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) voltou a celebrar, nesta quinta-feira (13), o que ele classifica como o fim da Cracolândia, no centro de São Paulo, esvaziada há seis meses. Em evento da área da educação, o mandatário destacou ações do governo estadual que teriam ajudado a acabar com o "fluxo" de dependentes químicos na Rua dos Protestantes.

Questionado sobre a presença de usuários em outras partes do Centro, o governador afirmou que o uso de drogas acontece “em qualquer grande centro”.

— (O uso de drogas) Sempre aconteceu e vai continuar acontecendo em qualquer grande centro. E onde tiver, nós vamos chegar, nós vamos abordar, vamos oferecer o cuidado, vamos oferecer a porta de saída [...] Quando a gente fala que acabou a Cracolândia, aquele cenário que nós tínhamos de venda de drogas ostensiva, de território livre, de cena de uso, isso não tem mais mesmo — afirmou o governador.

Seis meses após ‘fim’ da Cracolândia, moradores e comerciantes aprovam transformação, mas uso de drogas se espalha pelo Centro de SP

Entrevista: ‘A Cracolândia está fluida, e não foi por falta de drogas que se espalhou’, afirma promotor de SP

Nesta quinta, faz exatos seis meses que o "fluxo" na Rua dos Protestantes amanheceu vazio. Ao longo da semana, o GLOBO presenciou o uso e a venda de drogas em diversas áreas adjacentes. Nas vias próximas ao antigo fluxo, viaturas da GCM e da Polícia Militar fazem abordagens frequentes a dependentes e moradores de rua. Para membros do Ministério Público e organizações sociais, esse é o principal mecanismo que impede a formação de um novo agrupamento com centenas de pessoas na região, como era a Cracolândia.

As forças de segurança, principalmente a GCM, impedem que moradores de rua e usuários de drogas formem grupos maiores ou se fixem em vias públicas, segundo os relatos. Na terça-feira (11), o GLOBO encontrou diversos grupos de usuários espalhados pela área central. Nos Campos Elíseos, em ruas que cruzam a Avenida Rio Branco, área que deve abrigar a nova sede do governo do estado de São Paulo, aparecem concentrações de usuários, além da venda de crack em ruas como a Helvétia.

Homens acendem cachimbos de crack no entorno do Terminal Princesa Isabel, nos Campos Elíseos, região central de São Paulo

Maria Isabel Oliveira/ O Globo

Na Alameda Glete, cerca de vinte dependentes químicos se reuniram na esquina com a Rio Branco por volta das 17h. Na terceira vez que a reportagem passou pelo mesmo ponto, dez minutos depois de visualizar o grupo pela primeira vez, eles já tinham se dispersado.

No Bom Retiro, no entorno da Favela do Gato, na Rua Matarazzo, a presença de usuários também foi presenciada. Outro ponto é a Rua Amaral Gurgel, em canteiros que ficam antes da entrada do túnel que passa por baixo da Praça Roosevelt e no entorno da antiga cracolândia, na Santa Ifigênia, com grupos pequenos na Rua dos Andradas e na Rua Mauá.


O vice-governador Felício Ramuth rechaça que as forças do estado estejam deliberadamente impedindo a presença de usuários na área central.

— Ninguém está enxotando ninguém. O que nós estamos é fazendo abordagem social e saúde. Eu gosto de dizer que três vezes mais abordagens são feitas pela área social do que pela área de segurança pública. O pessoal da segurança aborda? Aborda também. O trabalho é baseado em abordagem social, de saúde, não em enxotamento. E, se tiver, (o policial) vai responder, porque pode acontecer — diz Ramuth.

O promotor de Justiça Arthur Pinto Filho, que há 13 anos atua na área da saúde pelo MP, afirma que os usuários se espalham pelo centro depois de abordagens truculentas da GCM.

— Sempre teve GCM no território, mas ela nunca foi a linha de frente da violência. Agora, há uma política pública de violência, não é uma coisa isolada do soldado, do guarda — ele afirma.

O secretário municipal de Segurança, Orlando Morando, diz que existe um trabalho contínuo para evitar novas concentrações, mas nega a truculência.

— Qualquer denúncia formal que a gente recebe, eu abro um processo na Corregedoria, e se não tiver uma denúncia, uma simples imagem para mim já é o suficiente, mas não recebi nada — diz Morando.

O vice-prefeito, Ricardo Mello (PL), também afirma que relatos são apurados.

— Se chega relato de truculência, é apurado. Não há dúvida que ninguém aceita isso. Agora, precisa ver a forma, porque o drogado também está agressivo e vem pra cima — diz Mello.