
Sob pressão dos EUA, Israel se prepara para realizar negociações indiretas com o Hamas no Egito

As negociações indiretas sobre a implementação da primeira fase do acordo para encerrar a guerra na Faixa de Gaza devem começar no domingo, no Cairo, publicou o jornal israelense Haaretz neste sábado. Segundo o veículo, autoridades israelenses acreditam que a Casa Branca exercerá pressão tanto sobre o Estado judeu quanto sobre o Hamas para acelerar as tratativas. Em Israel, a avaliação é a de que, embora a posição do grupo terrorista esteja longe de ser satisfatória para o governo Trump, o americano prefere dar continuidade ao processo e pressionar a organização para que aceite integralmente sua proposta de paz.
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Apesar do impulso, as dúvidas permanecem. Segundo a proposta, o Hamas libertaria todos os reféns em até três dias. O grupo também entregaria o poder e se desarmaria. Em troca, Israel interromperia a ofensiva, retiraria tropas de grande parte do território, libertaria centenas de prisioneiros palestinos e permitiria a entrada de ajuda humanitária. Depois, também autorizaria a reconstrução de Gaza. A organização palestina, no entanto, declarou que alguns aspectos do plano ainda precisam ser discutidos internamente.
Ainda assim, Trump disse acreditar que o grupo está “pronto para uma paz duradoura” e pediu que Israel interrompa “imediatamente o bombardeio de Gaza”, visando a retirada dos reféns “com segurança e rapidez”. A declaração forçou uma reposta imediata por parte de Israel, com o premier Benjamin Netanyahu afirmando que o Estado judeu atuará “em total coordenação com o presidente [Trump] e sua equipe para encerrar a guerra”. O Exército israelense também anunciou que passaria a realizar apenas operações defensivas no enclave.
Paralelamente, a equipe de negociação de Israel começou os preparativos para a retomada das conversas, que devem ocorrer no Egito, e não no Catar — reflexo das tensões entre Israel e o emirado após um ataque das Forças Armadas israelenses contra líderes do Hamas em Doha no mês passado, publicou o Haaretz. Segundo a emissora saudita al-Arabiya, uma delegação do Hamas deve chegar ao Cairo ainda na noite deste sábado para participar das negociações.
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A expectativa é de que o encontro defina os arranjos práticos da primeira fase do plano de Trump, incluindo o escopo da retirada militar israelense de Gaza. Israel deve apresentar mapas detalhando as áreas de recuo inicial das tropas. Washington também pretende envolver nas conversas o genro de Trump, Jared Kushner, o ministro israelense de Assuntos Estratégicos, Ron Dermer, e o chefe do serviço de inteligência interna de Israel (Shin Bet). O enviado especial de Trump para o Oriente Médio, Steve Witkoff, é esperado no Cairo neste sábado.
Enquanto isso, o governo israelense trabalha na definição de posições para pontos ainda vagos da proposta americana. Um dos principais impasses envolve a lista de prisioneiros palestinos que seriam libertados em troca dos reféns israelenses. O plano estabelece um número, mas não especifica os nomes — lacuna que Israel agora tenta preencher.
Outro tema sensível é a desmilitarização da Faixa de Gaza. O Hamas exige manter armas leves sob seu controle, condição ainda em análise por Israel. Também não há consenso sobre as zonas exatas de retirada do Exército nas três fases do acordo, uma vez que o texto do plano é considerado vago nesse aspecto.
— Entraremos em negociações sobre todos os aspectos relacionados ao programa — disse neste sábado Musa Abu Marzouk, alto funcionário do Hamas, ao ser questionado pela al-Jazeera sobre se o grupo aceitaria se desarmar e permitir o exílio de seus membros. — O movimento já afirmou que, no dia em que um Estado palestino soberano for criado, ele deixará de ser um grupo armado e entregará suas armas a esse Estado.
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Na sexta-feira, o Hamas anunciou que está disposto a libertar todos os reféns israelenses — vivos e mortos — nos termos da proposta americana. O grupo também afirmou estar pronto para iniciar negociações sobre os detalhes do acordo e se declarou disposto a transferir a administração de Gaza para um organismo palestino independente, “em coordenação nacional e com apoio árabe-islâmico”. O plano de Trump prevê que, durante o período de transição, a governança de Gaza ficará sob responsabilidade de um comitê liderado pelo próprio americano.
Segundo Marzouk, porém, apenas os nove primeiros pontos do plano de Trump dizem respeito diretamente ao Hamas. Os demais envolvem todas as facções palestinas, o povo palestino e o mundo árabe e islâmico em geral. Mesmo entre os pontos que afetam diretamente o grupo, alguns seriam “impossíveis” de cumprir, especialmente o prazo de 72 horas para a libertação de todos os reféns — considerando que, afirmou, “pode levar meses para encontrar os restos mortais”.
Em comunicado, o grupo afirmou ainda que “questões adicionais da proposta de Trump, relativas ao futuro da Faixa de Gaza e aos direitos do nosso povo, dependerão de uma posição nacional a ser discutida dentro de um amplo marco palestino”. O comunicado não fez menção à proposta de Trump de criar um “Conselho da Paz”, presidido por ele próprio e composto por outros líderes mundiais.
Na região, países árabes pressionaram fortemente o Hamas a aceitar o plano americano. Egito e Catar manifestaram apoio à declaração do grupo. O porta-voz do governo catariano, Majed Al Ansari, afirmou que seu país — que já atuou como mediador em negociações anteriores — apoia o esforço de Trump por “resultados rápidos que ponham fim ao derramamento de sangue dos palestinos na Faixa de Gaza”.
— Agora a bola está no campo de Netanyahu — avaliou Yousef Munayyer, diretor do programa Palestina-Israel do Centro Árabe em Washington. — Eles queriam que a Casa Branca tratasse isso como tudo ou nada. Mas isso sugere que Trump não está pronto para desistir. (Com Bloomberg)