Residencial de luxo ao lado de casarão tombado em Higienópolis causa protestos de vizinhos

 

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Um empreendimento imobiliário de luxo que está sendo erguido em Higienópolis tem causado protestos e revolta de moradores do bairro, que fica na região central de São Paulo. Isso porque o residencial de 20 andares, que terá unidades de até 260 metros quadrados que podem ultrapassar os R$ 8 milhões, ficará no mesmo terreno onde fica um casarão tombado.

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Trata-se do Palacete Piauí, uma construção do início do século XX feita a pedido de J. Mariano, sobrinho do ex-presidente Rodrigues Alves, foi tombado em 2012 pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (Conpresp).

Mas em 2023, o mesmo Conpresp autorizou que a incorporadora Helbor construísse um edifício residencial no terreno, desde que restaurasse o palacete e o deixasse aberto para fruição pública. O palacete, que estava fechado há alguns anos, foi reaberto para visitação no início de outubro. Mas moradores do entorno têm protestado contra o empreendimento. Em agosto, foi realizado um ato de moradores de Higienópolis em frente à obra, contra a construção de um prédio residencial no entorno de um patrimônio tombado.

O caso também gerou discordância até mesmo dentro da prefeitura, já que procuradores da área jurídica do município recomendaram restringir as regras de construção para este terreno, enquanto a Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento (SMUL) deu o alvará para a obra argumentando não haver restrições urbanísticas na área.

O arquiteto Cleiton de Paula, que faz parte do coletivo Pró-Higienópolis, argumenta que como a área onde fica o casarão é uma Zona Especial de Preservação Cultural (Zepec) por ter um Bem Imóvel Representativo (BIR), não poderia ser autorizada a construção de um prédio nesses moldes no mesmo lote.

Pela Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo, conhecida como Lei de Zoneamento do município, a área onde fica o palacete, na esquina das ruas Piauí e Itacolomi, é uma Zepec. Ocorre que aquela área está dentro de uma Zona Eixo de Estruturação da Transformação Urbana (ZEU), que são as áreas de São Paulo próximas aos corredores de ônibus ou estações de metrô e trem, nas quais podem ser construídos prédios com limite de altura maior. Enquanto os vizinhos defendem que é a classificação de Zepec que deve prevalecer, a prefeitura entendeu pelo contrário, e aplicou as regras que liberam construções maiores no local.

— A área de influência dos eixos são as ZEUs, onde a prefeitura incentiva a transformação, o adensamento, mas a preservação de patrimônio ambiental e cultural não está fora da Lei de Zoneamento e do Plano Diretor. Ali temos um imóvel tombado em 2012, que está dentro dos parâmetros do eixo, mas por ser Zepec ela está fora das influências desses perímetros — afirma Cleiton.

Em agosto, o Movimento Defenda São Paulo e outros cidadãos enviaram ofícios à Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento indagando sobre a aprovação do empreendimento em um casarão tombado. O caso foi analisado por diversos setores técnicos da pasta, que reiteraram que como o Conpresp havia autorizado a construção desde que mantidas as características originais do casarão, e que portanto não havia restrições para construir um prédio em cima e ao lado do palacete.

Mas em 17 de setembro os procuradores do município Nelson Seiji Matsuzawa e Roger Francisco Borges apontaram que, como existe uma sobreposição de duas classificações na área, é a mais rígida (a Zepec) que deve prevalecer. Por conta do conflito, os procuradores indicaram que o caso deveria ser remetido à Câmara Técnica de Legislação Urbanística (CTLU), que é responsável por analisar casos não previstos na legislação e dirimir dúvidas na aplicação da Lei de Zoneamento e Plano Diretor do município.

Em nota, a Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento informou que “todos os seus atos são pautados na legalidade, na transparência e em critérios estritamente técnicos” e que o alvará para esta obra “observou integralmente o que determinam as principais normas urbanísticas vigentes à época do protocolo realizado em 2022: a Lei de Zoneamento nº 16.402/2016 e o Plano Diretor Estratégico de 2014 (Artigo 65)”.

“As áreas técnicas da Pasta confirmam que, conforme esses parâmetros, o terreno é classificado como Zona de Estruturação Urbana (ZEU), que não impõe limite máximo de altura para as edificações. A SMUL reforça ainda que a Câmara Técnica de Legislação Urbanística (CTLU) analisa apenas situações omissas ou não previstas em lei — o que não se aplica ao presente caso”, afirmou a pasta.

O GLOBO procurou a Helbor para se posicionar, mas não recebeu resposta até o fechamento desta reportagem.