Projetos de recuperação de corais e manguezais ampliam proteção contra desastres naturais

 

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Os recifes de corais são, ao mesmo tempo, vítimas das mudanças climáticas e agentes de proteção contra elas. Esses ecossistemas desempenham papel vital para as cidades costeiras por atuarem como barreiras naturais contra a força das ondas e os impactos de tempestades e ressacas. Mas os corais são vulneráveis ao aumento da temperatura dos oceanos: a mudança gera o branqueamento, fenômeno que causa a perda das algas que vivem em seu interior e os leva à morte por falta de nutrientes.

Frear a perda dos recifes de corais é fundamental para a adaptação à crise climática e já mobiliza cientistas e empreendedores. Em Ipojuca, município pernambucano que abriga a famosa praia de Porto de Galinhas, o engenheiro de pesca Rudã Fernandes criou a Biofábrica de Corais, uma startup que nasceu a partir de seu projeto de pesquisa de doutorado no Departamento de Bioquímica da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e se estruturou como negócio de impacto social em 2022.

A iniciativa coleta fragmentos de corais danificados e os recupera em berçários, até o ponto de serem reintroduzidos no ambiente marinho. Uma das inovações é o uso de bases impressas em 3D com plástico biodegradável, que proporcionam suporte para o crescimento dos corais durante sua recuperação.

A Biofábrica de Corais atua em três frentes de cultivo: as praias de Porto de Galinhas e Tamandaré, em Pernambuco, e de Maragogi, em Alagoas.

— Temos a missão e a obrigação de não deixar um ecossistema colapsar na nossa frente, criando os mecanismos para evitar que isso aconteça — diz Fernandes, que comanda um time de 24 pessoas.

Pesquisador da Biofábrica de Corais mostra coral que será reimplantado na natureza

Divulgação

Os negócios criados a partir das chamadas soluções baseadas na natureza ainda são um mercado incipiente, mas que ganha relevância a partir de seu potencial para a adaptação às mudanças climáticas. Essas soluções envolvem restauração e incorporação dos ecossistemas naturais para a proteção contra desastres naturais, regulação do clima e melhoria da qualidade do ar e da água.

Outro exemplo vem do Pará, que abriga uma vasta extensão de manguezais ainda em bom estado de preservação — cerca de 131 mil hectares — e enfrenta o desafio de resguardá-los da degradação. O projeto Mangues da Amazônia atua há cinco anos em três reservas extrativistas marinhas nos municípios de Augusto Corrêa, Bragança, Tracuateua e Viseu.

Pesquisadores lideraram um estudo para aprimorar a forma de medir o estoque de carbono dos manguezais da costa amazônica e já apontam para um total de 18 milhões de toneladas de carbono estocadas nesses ecossistemas paraenses, o que os coloca entre os maiores sumidouros de carbono do mundo, concentrando de 5% a 14% de toda quantidade estocada por manguezais no planeta.

Ações de recuperação de manguezais realizadas pelo projeto Mangues da Amazônia, no Pará

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Desde 2021, o projeto recuperou 14 hectares de manguezais e monitora outros 35 hectares nas bordas dessas áreas. De acordo com Marcus Fernandes, coordenador do Laboratório de Ecologia de Manguezal (LAMA), da Universidade Federal do Pará (UFPA), o estudo confirma a importância dos manguezais não apenas para a mitigação das mudanças climáticas, quanto para a adaptação local das comunidades aos eventos extremos.

— O mangue preservado é estratégico, pois confere resiliência ecológica, proteção costeira e permite que os ecossistemas se recuperem de eventos extremos — diz o pesquisador.

Busca por apoio

Para as cidades costeiras, ainda mais vulneráveis a eventos climáticos extremos e elevação do nível do mar, ações como restauração dos recifes de corais, da vegetação de restinga e dos manguezais têm se mostrado eficazes e merecem receber maior atenção do poder público e de financiadores.

— É preciso ampliar esse conhecimento e defender a permanência da vegetação nativa, que é o que vai proteger a infraestrutura e proteger as cidades do avanço do mar — diz Juliana Baladelli Ribeiro, gerente da Fundação Grupo Boticário e uma das autoras do estudo “Cidades Azuis”, sobre soluções baseadas na natureza e resiliência costeira.

Coordenada pelo programa Maré de Ciência/Unifesp, Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e Unesco, o estudo elenca mais de 30 soluções que podem ser utilizadas por prefeituras para aumentar a resiliência das cidades litorâneas, como a restauração e proteção de habitats naturais da zona costeira. Ribeiro, uma das 78 especialistas escolhidas pela ONU para definir indicadores para a adaptação dos países às mudanças climáticas que serão discutidos na COP30, tem visto aumentar o interesse no tema.

A Fundação Grupo Boticário lançou neste ano a primeira incubadora de projetos de desenvolvimento urbano e adaptação climática com foco em soluções baseadas na natureza. Foram 101 propostas, das quais 29 estão recebendo apoio técnico e participarão de um pitch (apresentação voltada a investidores) na Cúpula Mundial de Prefeitos do C40, no Rio, na próxima semana.