PM investiga agentes acusados de intimidar pais e professores em escola infantil da Zona Oeste de SP
A PolÃcia Militar de São Paulo abriu um procedimento para investigar a conduta de uma equipe de quatro policiais acusada de intimidar pais e professores de uma escola infantil na Zona Oeste da cidade de São Paulo. Eles teriam entrado na instituição armados, com um dos agentes portando uma metralhadora. O caso ocorreu na semana passada, após o pai de uma criança, um policial militar da ativa, se incomodar com o desenho de uma orixá feito pela filha em aula de educação antirracista.
O pai seria o responsável por acionar os demais agentes para irem à escola. A filha tinha desenhado uma imagem de Iansã, orixá de religiões de matriz africana. Em nota para O GLOBO, a Secretaria de Segurança Pública informou que os policiais são da 2ª Companhia do 16º Batalho de PolÃcia. A imagem das câmeras corporais será colhida, assim como o depoimento dos policiais.
Uma servidora da Secretaria Municipal de Educação familiarizada com o caso explicou ao GLOBO que a Escola Municipal de Educação Infantil Antônio Bento, localizada no bairro do Butantã, abordava na sala de aula desde o primeiro semestre deste ano questões antirracistas, como prevê o currÃculo municipal.
O primeiro assunto abordado foram os povos originários e, a partir do segundo semestre, a temática é a educação antirracista. Os alunos trabalhavam com o livro Ciranda em Aruanda, que é fornecido pela prefeitura. A obra apresenta representações ilustradas de dez orixás. Na última semana, as crianças da escola realizaram desenhos baseados no livro.
As ilustrações desagradaram o pai de uma das alunas, que é um PM da ativa. No dia 11, ele teria retirado a filha da sala de aula e supostamente rasgado o desenho da filha. Na sequência o policial reclamou com a diretora da unidade ensino, afirmando que não queria que ela participasse de "trabalhos religiosos", e que as crenças de matrizes africanas não seriam a religião da famÃlia.
A diretora convidou então o policial para participar de uma reunião do conselho escolar, que ocorreria no dia seguinte, 12 de outubro, reunindo os pais, professores e demais profissionais da escola, para que ele trouxesse o assunto para discussão.
No dia 12, ao fim da tarde, familiares e professores da EMEI estavam na escola, aguardando o inÃcio da reunião do conselho, quando policiais militares entraram no espaço. Inicialmente, eles teriam afirmado que realizavam apenas uma ronda na área, mas depois informaram que receberam uma denúncia de que um culto religioso estaria ocorrendo dentro da escola.
A diretora e outros funcionários explicaram então sobre o projeto de educação antirracista, que é obrigatório dentro do currÃculo da cidade de São Paulo, e que a atividade desenvolvida no dia anterior tratava de intolerância religiosa.
Segundo a servidora da secretaria municipal, os agentes agiram de forma intimidatória contra os professores e servidores da escola enquanto eles tentavam explicar o caso. Do lado de fora, pais relataram que os policiais vieram acompanhados de ao menos quatro viaturas.
Segundo a Secretaria de Segurança Pública, a diretora registrou boletim de ocorrência por ameaça envolvendo o pai da estudante. O pai, por sua vez, negou a acusação de que danificou o painel da escola ao retirar um desenho feito pela filha. O 34º DP da Vila Sônia afirma que vai entrar em contato com a diretora para verificar se ela quer formalizar representação criminal sobre o caso.
"Caso haja representação, será instaurado inquérito policial, e todos os envolvidos e testemunhas serão ouvidos para completo esclarecimento e eventual responsabilização no âmbito criminal", informa a pasta.
Procurada, a Secretaria Municipal de Educação disse que o pai da estudante "recebeu esclarecimento que o trabalho apresentado por sua filha integra uma produção coletiva do grupo. A atividade faz parte de propostas pedagógicas da escola, que tornam obrigatório o ensino de história e cultura afro-brasileira e indÃgena dentro do CurrÃculo da Cidade de São Paulo".
No próximo dia 25 de novembro moradores do bairro, pais de crianças da EMEI, professores e entidades da sociedade civil realizarão uma passeata na área "contra a intolerância religiosa, a violência policial e o abuso de poder".
O caso foi alvo de repúdio por parte do Sindicato dos Profissionais em Educação do Ensino Municipal (Sinpeem), além de outras entidades ligadas a educação. "O sindicato reafirma que a atividade desenvolvida pela escola possui respaldo pedagógico e legal, uma vez que conteúdos relacionados à cultura afro-brasileira integram o currÃculo oficial da rede. Exigimos a apuração rigorosa dos fatos, o esclarecimento público das circunstâncias da atuação policial e a garantia de que episódios como este não voltem a ocorrer", diz o texto.
