O que se sabe sobre a megaoperação que apura sonegação de R$ 26 bilhões por parte do grupo Refit
A megaoperação da Receita Federal realizada na quinta-feira (27) em conjunto com autoridades de cinco estados e o Distrito Federal que teve como alvo principal o grupo Refit foi responsável por cumprir 126 mandados de busca e apreensão para desvendar um esquema criminoso que causou um prejuízo de R$ 26 bilhões aos cofres estaduais e da União.
Ao todo, foram bloqueados R$ 10, 2 bilhões, entre recursos em espécie e em contas bancárias, imóveis e veículos, para a garantia de pagamentos de débitos tributários que não foram pagos pelas empresas do grupo.
A ação teve como foco principal o empresário e advogado Ricardo Andrade Magro, acusado de ser o maior sonegador de impostos do Brasil, mas que não foi localizado pelas autoridades. Ele mora em Miami, nos Estados Unidos. Magro também possui cidadania e endereços em Portugal. Suas empresas e seus escritórios no Brasil, no entanto, foram vasculhados pelos agentes. A maior delas é a refinaria Manguinhos, no Rio de Janeiro, figura central no esquema criminoso, segundo os investigadores do caso.
Somente em São Paulo, a empresa é geradora de R$ 9,8 bilhões em débitos de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) não pagos, motivo pelo qual é acusada de criar um "abismo fiscal" que lhe proporciona vantagens frente à concorrência. Mesmo após a cassação da Inscrição Estadual de Substituto Tributário (IE-ST), a refinaria continuou a atuar no mercado, segundo os investigadores, repassando seu combustível e a responsabilidade tributária para empresas-espelho. Além disso, embora a dívida da refinaria seja da própria empresa, seu patrimônio, que poderia ser objeto de arrestos e penhoras, é protegido por uma cadeia de holdings e fundos de investimento, o que evidencia, para a Justiça, uma interposição societária capaz de blindar os ativos do grupo.
O GLOBO obteve acesso ao pedido de busca e apreensão, feito pelo Ministério Público de São Paulo e aceito pela juíza Marcia Mayumi Okoda Oshiro, da 2° Vara de Crimes Tributários, Organização Criminosa e Lavagem de Bens e Valores da Capital. No documento, as autoridades mostram como a rede se estruturou para comandar sua cadeia de comercialização de combustíveis.
Infográfico mostra como funcionava o fluxo de dinheiro da Refit
Arte O Globo
"O modus operandi da organização consiste no uso de empresas sucessoras (Fera, Flager, Império, Start, Orizona, etc.) e interpostas (Rodopetro) para burlar os Regimes Especiais de Oficio (REOs) impostos pela SEFAZ/SP (Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo) mantendo o fluxo de combustíveis e evitando o recolhimento do ICMS. Tais valores são então submetidos a atos de lavagem de capitais com a utilização coordenada de um núcleo financeiro (Yield, Euro, Gestão, Alpha) e de fundos de investimento para movimentar valores incompatíveis com o faturamento (movimentação de R$ 20 bilhões em SP), ocultar a origem ilícita dos recursos e proteger o patrimônio obtido com a fraude. Consta ainda o uso de holdings (Xoroque, Churchill) e de empresas imobiliárias (Athena Real State) para aquisições superfaturadas, além de sucessivas reestruturações societárias subscritas pelo núcleo jurídico (Magro Advogados), visando garantir a imunidade dos líderes e beneficiários", diz um trecho do documento assinado pela magistrada paulista.
Sobre os fundos de investimento, até o momento foram identificados 17 deles ligados à Refit, cujos patrimônios chegam a R$ 8 bilhões, e que, na maioria das vezes, possuem apenas um cotista. Em outros casos, há participação de sócios estrangeiros, cujas empresas foram constituídas no estado de Delaware, nos Estados Unidos, onde é possível abrir firmas LLC (Limited Liability Company) com garantia de anonimato e sem tributação local. Um desses fundos, o EUV Zeus "enviou mais de US$ 200 milhões para a offshore Clearedge Capital LLC (constituída em Delaware sete dias antes do fundo), sob a forma de empréstimo (mútuo conversível), com o objetivo de retirar os lucros da sonegação do Brasil, com risco de prejuízo futuro simulado no balanço do fundo", diz um outro trecho do documento judicial.
Ainda segundo a autorização de busca e apreensão, os indícios de ilícitos foram extraídos de documentações como relatórios de secretarias de fazenda estaduais, comunicações com o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), entre outros. Caso a investigação avance, as atuais suspeitas podem caracterizar tipificações penais como organização criminosa, fraude fiscal estruturada, lavagem de dinheiro, crimes contra a ordem tributária e falsidade ideológica.
Procurada na quinta-feira (27), a Refit afirmou em nota que “os débitos tributários” mencionados “estão sendo questionados pela companhia judicialmente, exatamente como fazem inúmeras empresas brasileiras que divergem de uma cobrança”. “Trata-se, portanto, de uma disputa jurídica legítima”, argumenta, e não de “tentativa de ocultar receitas ou fraudar o recolhimento de tributos”. Sobre os outros pontos da investigação, em relação às empresas interpostas e sucessoras, a companhia não respondeu à reportagem. o
