O que é cota parlamentar, foco de investigação da PF que mira Sóstenes e Jordy
A Polícia Federal investiga supostos desvios de recursos públicos oriundos da cota parlamentar a que os deputados federais Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) e Carlos Jordy (PL-RJ) têm direito para o exercício do mandato. Os agentes cumprem mandados de busca e apreensão, nesta sexta-feira, em endereços ligados aos dois para apurar um suposto esquema de pagamentos irregulares, a partir de contratos falsos com locadoras de veículos.
Dinheiro vivo: PF apreende R$ 430 mil em espécie em endereço ligado a deputado Sóstenes Cavalcante
Prévia: Antes de mirar Sóstenes e Jordy, PF fez operação contra assessores em investigação por suspeita de desvio de cota parlamentar
Há um ano, quando assessores dos parlamentares foram alvo de operação, o GLOBO mostrou que os gastos de Sóstenes com aluguel de carro representavam quase o dobro da média dos valores declarados por outros parlamentares, de acordo com um levantamento no Portal de Transparência da Câmara dos Deputados. Ao longo de 2024, os gastos do parlamentar ultrapassaram R$ 137,9 mil, enquanto a média das despesas de outros deputados com essa categoria foi de cerca de R$ 76,8 mil.
A Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar (CEAP) foi instituída pelo Ato da Mesa 43/2009, que unificou a verba indenizatória (em vigor desde 2001), a cota de passagens aéreas e a cota postal-telefônica. Trata-se de um benefício pago mensalmente para os deputados custearem "despesas típicas" do exercício do mandato, como aluguel de escritório de apoio no estado, passagens aéreas, alimentação, aluguel de carro, combustível, entre outras.
O valor da cota difere para cada unidade da federação, já que leva em conta, no cálculo, o preço de passagens aéreas de Brasília até a capital do estado pelo qual o parlamentar foi eleito. No caso de Sóstenes e Jordy, o valor atual é de R$ 41.553,77, conforme dados do site da Câmara. O maior valor é concedido aos deputados de Roraima, R$ RR 51.406,33; e o menor, do próprio DF, R$ 36.582,46.
Sóstenes tem direito a um adicional da cota por ser, desde o início do ano, líder da bancada do PL na Câmara, sigla com maior número de parlamentares na Casa. O site da Câmara destaca que os parlamentares que exercem cargo de líder ou vice-líder de partido político ou de bloco parlamentar; líder do governo na Câmara ou no Congresso; líder da minoria; presidente ou vice-presidente de comissão permanente; e representante de partidos políticos com menos de um centésimo da composição da Casa têm direito a mais R$ 1.353,04 no valor mensal.
Os deputados usufruem do valor por meio de reembolso ou débito no valor da cota. Caso não utilize todo o dinheiro do mês, o saldo se acumula para o mês seguinte. É vedado, porém, acumular verba de um exercício financeiro para o outro.
O site da Câmara lista quais despesas podem ser pagas com a cota parlamentar:
Passagens aéreas, incluindo o despacho de bagagens pessoais e os serviços de acesso à internet oferecidos por companhias aéreas ou aeroportos;
Telefones dos gabinetes, dos escritórios nos estados e dos imóveis funcionais, e as despesas com o celular funcional do deputado. As contas devem ser de comprovada responsabilidade do parlamentar;
Manutenção de escritórios de apoio à atividade parlamentar, como locação de imóveis, energia elétrica, água e esgoto, acesso à internet, entre outros;
Assinatura de publicações;
Alimentação do deputado;
Hospedagem, exceto no Distrito Federal;
Despesas com locomoção por locação ou fretamento de aeronaves, de veículos automotores (limite inacumulável de R$ 12.713,00 mensais), de embarcações; de serviços de táxi, pedágio e estacionamento (limite inacumulável de R$ 2.700,00 mensais); de passagens terrestres, marítimas ou fluviais.
Combustíveis e lubrificantes (limite inacumulável de R$ 9.392,00 mensais);
Serviços de segurança de empresas especializadas (limite inacumulável de R$ 8.700,00 mensais);
Divulgação da atividade parlamentar (exceto nos 120 dias anteriores à data das eleições, se for candidato);
Participação em cursos, congressos ou eventos, realizados por instituição especializada (limite mensal inacumulável de 25% do valor da menor cota – hoje R$7.697,17);
Complementação de auxílio-moradia, de acordo com o Ato da Mesa 104/88 (limite inacumulável de R$ 4.148,80 mensais);
Aquisição de tokens e certificados digitais.
Não podem ser pagas com cota parlamentar despesas em bens ou serviços de empresa que pertença ao deputado ou parente ou servidor da Câmara; pagamentos realizados a uma pessoa física (exceto para locação de embarcação, táxi, uso de aeronave); aquisição de gêneros alimentícios ou de materiais que durem mais de dois anos; gastos de caráter eleitoral; gastos referentes à participação do deputado em cursos de educação básica, graduação e pós-graduação; entre outros.
A operação
Ao todo, são sete mandados de busca e apreensão, determinados pelo Supremo Tribunal Federal (STF), cumpridos no Rio e no Distrito Federal. Em um endereço ligado a Sóstenes, em Brasília, os agentes encontraram R$ 430 mil em dinheiro vivo.
De acordo com a PF, "agentes políticos, servidores comissionados e particulares teriam atuado de forma coordenada para o desvio e posterior ocultação de verba pública".
Nas redes sociais, Jordy afirmou que é alvo de uma "perseguição implacável" e de "pesca probatória". Sóstenes foi procurado, mas ainda não se manifestou.
A reportagem apurou que o dinheiro desviado era enviado para empresas de fachada. O grupo, então, promoviam a lavagem dos recursos. Os assessores dos dois movimentaram milhões, segundo a investigação.
PF apreende dinheiro com deputado federal
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Desdobramentos
Um ano antes de fazer a operação que tem como alvos o líder do PL na Câmara, Sóstenes Cavalcante (RJ), e o deputado Carlos Jordy, a Polícia Federal cumpriu mandados de busca e apreensão contra assessores dos deputados.
A operação da época foi denominada "Rent a Car" em referência ao suposto esquema, no qual uma empresa de locação de veículos era usada para simular contratos de prestação de serviços. Ainda segundo os investigadores, agentes públicos e empresários teriam firmado um "acordo ilícito para o desvio de recursos públicos oriundos de cotas parlamentares" a partir dessa prática.
Levantamento feito pelo GLOBO em dezembro do ano passado mostrou que os gastos de Sóstenes com aluguel de carro em 2024 representavam quase o dobro da média dos valores declarados por outros parlamentares.
Ao longo do ano passado, os gastos do parlamentar ultrapassaram R$ 137,9 mil, enquanto a média das despesas de outros deputados com essa categoria foi aproximadamente R$ 76,8 mil.
Já as despesas de Carlos Jordy com o aluguel de carros foram de R$ 65, 4 mil, estando abaixo da média geral e da sigla.
