Novo Marco Legal dos Seguros passa a valer em dezembro: entenda as principais mudanças na lei
Entre os pontos centrais previstos da nova norma estão mais transparência e boa-fé nos contratos entre as partes, sob pena de cancelamentos, além de prazo ampliado para aceitação da proposta e pagamento de indenizações de sinistros. As seguradoras, porém, terão limitações na quantidade de vezes que exigem documentos e comprovantes aos segurados. A viagem para a Europa do analista de processos Felipe Silva virou uma verdadeira dor de cabeça, já que as bagagens da família foram extraviadas pela companhia aérea. Diante disso, ele precisou acionar o seguro viagem para conseguir comprar roupas e itens básicos, mas enfrentou outro desgaste. Na ocasião, a seguradora criou dificuldades para cumprir o serviço contratado.
"Após muita discussão e eu ameaçar entrar na Justiça para que aquele valor fosse pago, das compras que realizamos na Europa em relação ao reembolso das malas extraviadas, somente após muita insistência mesmo, eles realizaram o pagamento. Mas teve muita dor de cabeça. Inicialmente tive que pagar do meu bolso para, posteriormente, eles me reembolsarem parte daquilo que eu havia comprado", relatou.
Situações como essa enfrentada pelo analista devem ser menos frequentes a partir do novo Marco Legal dos Seguros, que entra em vigor no país em 11 de dezembro. A legislação, aprovada em 2024, unificou as regras gerais já existentes no Brasil e criou um marco regulatório sobre todos os tipos de seguros.
A advogada especialista em seguros Thaís Helena dos Santos destaca que, entre os pontos centrais da norma, estão a boa-fé, transparência e colaboração entre seguradoras, corretores e consumidores. Inclusive, o Marco prevê que o descumprimento pode gerar consequências para ambos os lados.
"O que é novo? É novo que o descumprimento dessa boa-fé, dessa transparência, realmente causa uma consequência prática naquela relação. Então, o consumidor, por exemplo, que descumprir uma informação, que agir com má-fé ou que não for totalmente transparente no fornecimento daquela informação, ele pode sim perder o direito àquela garantia ou pode ter uma redução proporcional do valor da indenização. Ou ele ainda pode ter que arcar com perdas e danos em razão dessa falta de transparência, essa falta de colaboração", explicou.
O Marco Legal dos Seguros também modifica prazos para aceitação de propostas e pagamentos. Com a nova norma, passou de 15 para 25 dias o tempo para que a seguradora informe se aceita ou recusa uma proposta em negociação com o consumidor. Se o prazo expirar sem uma manifestação da empresa, a proposta é automaticamente aceita.
A diretora jurídica da Confederação Nacional das Seguradoras, Glauce Carvalhal, explica, ainda, as alterações para pagamentos de indenizações de sinistros, como de acidentes de carro.
"O prazo antes dos seguros massificados era único, 30 dias, para seguro residencial, de vida, para tudo, para você regular e liquidar. O prazo agora está ampliado. Esse prazo, ele é de 30 dias para regular e de 30 dias para liquidar, isso para os seguros em geral. E para os seguros mais complexos, que são os grandes seguros para plataformas de petróleo, barragens, enfim, esse prazo pode chegar até 120 dias. De qualquer forma, a lei determina que a seguradora deve se esforçar para fazer a liquidação e a regulação de forma concomitante, ou seja, as duas ao mesmo tempo, para responder mais rápido ao segurado", apontou.
Ainda nesse aspecto, o presidente do Sindicato dos Corretores de Seguros de Minas Gerais, Gustavo Bentes, explicou que outra grande alteração do Marco se refere à limitação de solicitações de documentos pelas seguradoras.
"A companhia vai ter a primeira data de comunicação do sinistro e o prazo de documentos. Ela tem uma única vez, além desta, para solicitar todos os documentos. Então, se faltar algum documento, a seguradora não pode pedir novamente. Se, por uma fragilidade administrativa e operacional, ela esquecer de alguma coisa, o cliente não tem responsabilidade sobre isso. Na situação atual, não tem essa segurança para o consumidor e o que desgasta muito a relação entre consumidores e seguradores é exatamente esse arrastar do prazo", disse.
O novo Marco Legal dos Seguros ainda impede o cancelamento unilateral do contrato pela seguradora, salvo quando existe um descumprimento pelo consumidor. Como, por exemplo, inadimplência ou omissão de informações.
Houve também alterações no entendimento sobre o agravamento de risco, que ocorre quando o segurado informa o aumento da probabilidade de um sinistro ou do valor potencial do prejuízo. Com o novo Marco, só pode ocorrer a perda da garantia se comprovado que o consumidor agiu intencionalmente com má-fé.
Após a sanção da lei pelo governo federal, as seguradoras e corretoras tiveram um ano para se adequar às novas normas. Na avaliação da diretora jurídica da Confederação Nacional das Seguradoras, Glauce Carvalhal, algumas divergências ainda devem surgir sobre as regras.
"Como é uma lei nova, nós não sabemos ainda qual será a melhor interpretação dessa legislação. Então, é fundamental ter uma cooperação com o regulador. A gente tem uma expectativa muito grande com a regulação que virá da Superintendência de Seguros Privados de alguns aspectos da lei. Teremos que ter uma cooperação com o próprio consumidor de seguro, com as seguradoras, com o próprio judiciário, caso haja judicialização na matéria, para que realmente haja uma verdadeira interpretação do que a lei trouxe de novidade. Então, me parece que a gente pode concluir dizendo que essa lei foi uma grande oportunidade de revisão de fluxos, revisão de processo e, por que não, até desenvolvimento de novos produtos", avaliou.
No Brasil, o setor de seguros movimentou R$ 376 bilhões em prêmios, contribuições e faturamentos no primeiro semestre de 2025, segundo a Superintendência de Seguros Privados. O valor representa alta de 4,2% em relação ao mesmo período de 2024. Já os pagamentos em indenizações e benefícios somaram R$ 268 bilhões, um avanço de 8,7%.
