Nobel da Paz: Filha de María Corina recebe prêmio pela mãe em cerimônia marcada por pedido de renúncia de Maduro; veja vídeo
Esvaziada pela ausência da líder opositora venezuelana, María Corina Machado, a cerimônia do Prêmio Nobel da Paz foi marcada por discursos críticos ao líder chavista, Nicolás Maduro, incluindo um pedido direto por sua renúncia por parte do Comitê Norueguês do Nobel nesta quarta-feira em Oslo. A premiação foi entregue à filha de María Corina, Ana Corina Sosa Machado, que apresentou um discurso escrito pela mãe, em que denunciou o que chamou de "terrorismo de Estado".
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A presença ou não da "dama de ferro" em Oslo para a premiação havia provocado dúvida e expectativa nos últimos dias, entre confirmações públicas por parte de sua equipe e do instituto organizador. Mas o Instituto do Nobel Norueguês informou pouco antes do início da cerimônia que a opositora estava a caminho de Oslo, mas só chegaria entre a noite desta quarta e quinta-feira, portanto, após a cerimônia.
Assista à transmissão oficial na íntegra (em inglês):
— Minha geração nasceu em uma democracia vibrante, e nós a tomávamos como garantida. Presumíamos que a liberdade era tão permanente quanto o ar que respirávamos. Valorizávamos nossos direitos, mas nos esquecíamos de nossos deveres — disse Ana, ao ler o discurso escrito pela mãe. — Quando percebemos a fragilidade de nossas instituições, um homem que outrora liderara um golpe militar [Hugo Chávez, em 1992] para derrubar a democracia foi eleito presidente. Muitos pensaram que o carisma poderia substituir o Estado de Direito.
Aludindo aos sequestros, torturas e perseguições contra membros da oposição, a laureada com o Nobel da Paz denunciou os "crimes contra a Humanidade, documentados pelas Nações Unidas" e acusou o regime chavista de cometer "terrorismo de Estado, usado para sufocar a vontade do povo".
— Se queremos democracia, precisamos estar dispostos a lutar pela liberdade — acrescentou.
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O discurso escrito pela líder opositora não foi o único com críticas contundentes ao regime. Ainda na abertura do evento, o presidente do Comitê Norueguês do Nobel, Jorgen Watne Frydnes, culpou o líder chavista pela repressão, tortura e silenciamento sistemático da oposição, em um discurso carregado de acusações.
— Qualquer pessoa que ainda acredite em dizer a verdade em voz alta pode desaparecer violentamente em um sistema criado especificamente para erradicar essa crença. Enquanto estamos sentados aqui na Prefeitura de Oslo, pessoas inocentes estão trancadas em celas escuras na Venezuela. Elas não podem ouvir os discursos feitos hoje, apenas os gritos de prisioneiros sendo torturados — afirmou. — A Venezuela se transformou em um Estado autoritário e brutal, enfrentando uma profunda crise humanitária e econômica. Enquanto isso, uma pequena elite no topo, protegida pelo poder político, por armas e pela impunidade legal, enriquece.
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Frydnes também abordou a escalada de tensões ao redor da Venezuela, incluindo o risco de uma invasão americana — sem se referir diretamente aos EUA. O presidente do Comitê do Nobel eximiu a oposição venezuelana de qualquer culpa pela escalada atual e criticou a construção narrativa do governo de Caracas, que aponta os opositores como intervencionistas.
— Esta é a versão da realidade que o regime de Maduro apresenta ao mundo: que ele é o garantidor da paz. Mas uma paz baseada no medo, no silêncio e na tortura não é paz. É submissão, disfarçada de estabilidade — disse o presidente. — Não, a fonte da violência não são os ativistas democráticos. São aqueles no topo que se recusam a ceder o poder. Não foi Nelson Mandela quem tornou a África do Sul violenta, mas a repressão do regime do apartheid contra as demandas por igualdade.
Antes de encerrar o discurso, o presidente do Nobel fez um apelo direto ao líder venezuelano, sendo entrecortado pelos aplausos da plateia.
— Senhor Maduro: aceite o resultado da eleição e entregue o cargo. Lance as bases para uma transição pacífica para a democracia, pois essa é a vontade do povo venezuelano
Entre as autoridades presentes no evento estavam os presidentes Javier Milei (Argentina), Daniel Noboa (Equador), Santiago Peña (Paraguai) e José Raúl Mulino (Panamá). O opositor venezuelano Edmundo González Urrutia, que substituiu María Corina como candidato da oposição nas eleições do ano passado e vive exilado na Espanha, também assistiu à cerimônia — sendo tratado pelo comitê como presidente eleito da Venezuela.
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Corina em Oslo
O diretor do Instituto Nobel Norueguês, Kristian Berg Harpviken, anunciou no sábado que María Corina receberia a honraria em mãos, mas precisou recuar pouco depois. O cancelamento de uma entrevista coletiva na terça-feira deu indicativos de que a participação não ocorreria de fato. Na clandestinidade desde o último processo eleitoral, no qual Maduro se declarou vencedor sem a apresentação dos resultados oficiais detalhados, María Corina sofre com limitações de deslocamento impostas pela lei.
A incerteza permaneceu até a manhã desta quarta. Horas antes da cerimônia, a organização afirmou que a venezuelana não compareceria à Prefeitura de Oslo, mencionando que a opositora "vive sob ameaça de morte do regime".
— Essa ameaça também se aplica quando está fora do país, tanto por parte do regime quanto dos amigos do regime em todo o mundo — afirmou Harpviken.
Ana Corina Sosa Machado, filha de María Corina Machado, chega para a premiação do Nobel da Paz em Oslo
Gorm Kallestad / NTB / AFP
Pouco depois, porém, o instituto confirmou que María Corina seguia em direção à capital norueguesa, com chegada prevista para depois da premiação.
"Embora não possa chegar à cerimônia, nem aos atos de hoje, ficamos profundamente felizes em confirmar que ela está a salvo e que estará conosco em Oslo", afirmou o instituto em um breve comunicado, que cita uma "viagem em uma situação de extremo perigo".
O instituto divulgou uma gravação de áudio em que a líder opositora explicou a ausência e agradeceu pela premiação.
— Pessoalmente, contarei a vocês... o que tivemos que enfrentar e quantas pessoas arriscaram suas vidas para que eu pudesse chegar a Oslo, e sou muito grata a elas, e isso demonstra o que esse reconhecimento significa para o povo venezuelano — disse María Corina. — Estamos muito emocionados e honrados, e é por isso que lamento muito informar que não poderei chegar a tempo para a cerimônia.
María Corina foi anunciada como vencedora em 10 de outubro. O Comitê do Nobel justificou o seu "incansável trabalho em favor dos direitos democráticos do povo venezuelano e por sua luta por uma transição justa e pacífica da ditadura à democracia". (Com AFP)
