Marte já foi verde e tropical? Rochas 'branqueadas' reforçam hipótese de passado úmido no Planeta Vermelho
Marte já pode ter sido um planeta verde e úmido, coberto por chuvas e paisagens semelhantes às florestas tropicais da Terra? Um novo estudo, publicado no inicio de dezembro, sugere que sim, a partir da descoberta de rochas “branqueadas” na superfície marciana, associadas a condições climáticas quentes e chuvosas que teriam persistido por milhões de anos.
Os fragmentos foram identificados pelo rover Perseverance, da NASA, durante sua exploração na Cratera Jezero, uma antiga bacia de impacto de 45 quilômetros de extensão que abrigou um lago de água líquida há bilhões de anos. As imagens e análises iniciais feitas pelos instrumentos SuperCam e Mastcam-Z permitiram comparar o material com formações semelhantes encontradas na Terra.
As rochas são compostas por caulinita, um mineral argiloso branco que, na Terra, se forma em ambientes tropicais muito úmidos, após longos períodos de chuvas intensas que “lixiviam” outros minerais das rochas. Para os cientistas da Universidade Purdue, em Indiana, a presença desse tipo de material em Marte é um forte indício de que o planeta já teve um clima semelhante ao de regiões como a floresta amazônica e áreas florestais da África Ocidental.
A professora Briony Horgan, especialista em ciência planetária e uma das autoras do estudo, classificou os fragmentos como “provavelmente alguns dos afloramentos mais importantes já observados” em Marte. Segundo ela, as evidências apontam para um ambiente antigo “mais quente e úmido, onde chovia durante milhões de anos”, cenário considerado favorável ao surgimento e à manutenção de vida.
Os pesquisadores destacam que não há grandes formações de caulinita nas proximidades que expliquem facilmente a origem desses fragmentos, o que levanta a hipótese de que tenham sido transportados por rios antigos que alimentavam o lago de Jezero ou mesmo lançados na cratera por impactos de meteoritos. Em ambos os casos, as rochas seriam registros diretos de um período em que a água era abundante e ativa na superfície marciana.
O contraste com o Marte atual torna a descoberta ainda mais significativa. Hoje, o planeta é frio, seco e empoeirado, com uma atmosfera extremamente tênue composta em cerca de 95% por dióxido de carbono. A água existe principalmente em forma de gelo abaixo da superfície, sobretudo nas regiões polares, além de pequenos fluxos sazonais de água salobra em encostas e paredes de crateras.
Segundo estimativas da NASA, há cerca de 4,3 bilhões de anos Marte teria tido água suficiente para cobrir toda a superfície com uma camada de aproximadamente 137 metros de profundidade. Por volta de 3,5 bilhões de anos atrás, essa água já estava mais concentrada em sistemas de lagos e rios, e os últimos grandes episódios de água líquida na superfície podem ter ocorrido há cerca de 2 bilhões de anos, antes da perda significativa da atmosfera.
O novo trabalho, publicado na revista Communications Earth & Environment, em 1º de dezembro, reforça a ideia de que Marte teve um passado aquático complexo, com deltas, leitos de lagos e redes de vales fluviais. Como resume a própria agência espacial americana, o planeta apresenta rochas e minerais que só poderiam ter se formado na presença de água líquida, além de evidências de inundações massivas há cerca de 3,5 bilhões de anos.
Para os cientistas, as rochas de caulinita espalhadas ao longo do trajeto do Perseverance são, hoje, uma das provas mais concretas de que o Planeta Vermelho já foi, em algum momento de sua história, um mundo potencialmente habitável — muito diferente do deserto gelado que observamos atualmente.
