Mais procurados do país 'driblaram' forças de segurança e acumularam patrimônio multimilionário; veja

 

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André do Rap, da facção Primeiro Comando Capital (PCC); o traficante do Comando Vermelho (CV) Doca, um dos alvos da megaoperação no Rio em outubro; e o bicheiro Bernardo Bello, cuja trajetória foi retratada na série do Globoplay Vale o escrito são três dos 216 foragidos que compõem um novo site com informações sobre os mais procurados no Brasil. Conhecidos nacionalmente, os criminosos conseguiram driblar as forças de segurança ao longo dos anos e acumular fortunas advindas, segundo investigadores, de diferentes esquemas ilícitos.

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Para a nova plataforma, lançada nesta segunda-feira, cada estado indicou os criminosos cuja prisão é prioritária com base em uma matriz de risco. Foram avaliados aspectos como gravidade e natureza do crime cometido, vinculação com organizações criminosas, existência de múltiplos mandados de prisão e atuação interestadual.

André do Rap

André do Rap é denunciado pelo MPRJ por lavagem de dinheiro

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André do Rap é responsável por intermediar o envio de toneladas de cocaína para a Europa e África — o que o tornou um alvo de autoridades nacionais e internacionais. Condenado a 25 anos de prisão por tráfico internacional de drogas em 1ª e 2ª instâncias, ele foi beneficiado, em outubro de 2020, por um habeas corpus pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Em um drible, o André do Rap conseguiu sair do presídio. Isso porque, poucas horas depois da decisão do ministro do STF Marco Aurélio de Mello — hoje aposentado —, o presidente da Corte, ministro Luiz Fux, acolheu um pedido da Procuradoria-geral da República (PGR) e revogou a decisão.

Na argumentação, Fux afirmou que uma liminar pode ser suspensa quando demonstrado que seu efeito pode causar grave lesão à ordem e à segurança. “Sabe-se que o crime organizado, nem mesmo com a prisão de seus líderes, é facilmente desmantelado. O que dizer com o retorno à liberdade de chefe de organização criminosa? Desbaratar uma organização criminosa é um imperativo da ordem pública”, escreveu o magistrado na ocasião.

Apesar disso, André do Rap foi liberado e está desaparecido desde então. Hoje, ele é procurado, pela Justiça de São Paulo (TJSP) e pela Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ).

Antes dessa prisão, há quase cinco anos, André do Rap já havia escapado das forças de segurança entre 2014 e 2019 até ser localizado numa mansão em Angra dos Reis, na Costa Verde do Rio. À época, ele foi dado como suspeito de acumular uma fortuna de ao menos R$ 17 milhões com o tráfico. O traficante se apresentava como empresário que realizava eventos e promovia shows de funk, rap e hip hop. Também costumava patrocinar surfistas. Várias ações, segundo os investigadores, miravam a lavagem de dinheiro.

Documento da Polícia Civil paulista obtido pelo Estadão aponta que, de janeiro de 2024 a maio deste ano, o crime organizado movimentou mais de R$ 16 bilhões em 100.097 contas bancárias. Empresas suspeitas de elo com André do Rap teriam valores suspeitos de mais de R$ 25 milhões.

Doca

Edgar Alves de Andrade, o Doca ou Urso, é considerado foragido da Justiça

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Edgard Alves de Andrade, o Doca, de 55 anos, foi o principal alvo da megaoperação das polícias Civil e Militar nos complexos da Penha e do Alemão, na Zona Norte do Rio, em outubro. A Polícia Civil aponta ele como um dos integrantes da cúpula do CV, com atuação no Complexo Penha.

No dia em que uma megaoperação policial foi deflagrada, o alvo principal dos 2,5 mil agentes mobilizados ganhou novo cartaz de “procurado” no Disque Denúncia. No anúncio lançado, além da foto atualizada, a recompensa por informações que levem à captura de Doca saltou para R$ 100 mil — contra os R$ 1 mil oferecidos anteriormente. Doca não foi localizado.

De acordo com promotores do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco/MPRJ), Doca — ou Urso, como também é conhecido — é o principal líder do CV no Complexo da Penha e em comunidades como Gardênia Azul e César Maia, na Zona Sudoeste, e Juramento, na Zona Norte, algumas delas recentemente tomadas da milícia.

Ele é investigado por mais de cem homicídios, incluindo execuções de crianças e desaparecimentos de moradores. Em outubro de 2023, Doca foi apontado como o mandante da execução de três médicos e da tentativa de homicídio de uma quarta vítima na Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio. As vítimas participavam de um congresso de medicina e foram confundidas com milicianos de Rio das Pedras.

A Polícia Civil acredita que Doca tenha ordenado ações de traficantes na Gardênia e em Rio das Pedras. O traficante ficou conhecido também por ter como homem de confiança o BMW, que pode estar à frente da nova guerra entre traficantes e milicianos nessas duas comunidades e, segundo investigações, BMW é procurado pela polícia desde que três médicos foram executados em um quiosque na Barra da Tijuca, em outubro de 2023.

Doca já foi um dos alvos da operação Buzz Bomb, deflagrada em setembro do ano passado, pela Polícia Federal para reprimir o uso de drones lançadores de granadas, operados por pessoas ligadas ao CV. Contra ele há mais de 20 mandados de prisão expedidos pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), segundo dados do site do Conselho Nacional de Justiça.

Na época da Buzz Bomb, Doca teve prisão preventiva decretada pela 1ª Vara Criminal Especializada em Organização Criminosa do TJRJ. Ele foi denunciado pelos crimes de organização criminosa e posse de material explosivo, cujas penas somadas podem chegar até 14 anos de prisão, em caso de condenação.

Bernardo Bello

O contraventor Bernardo Bello

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Bernardo Bello Pimentel Barboza tem uma vida em que mistura bens de luxo, usados para esconder a origem ilícita de sua riqueza, e crimes que vão da contravenção a execuções de inimigos. O bicheiro é investigado em casos de assassinatos, de rivais a desafetos, e, durante a participação na série do GloboPlay Vale o Escrito, afirmou que um de seus rivais quer matá-lo.

Acusado de ser o mentor intelectual da morte do contraventor Alcebíades Paes Garcia, o Bid, assassinato cometido em 25 de fevereiro de 2020, Bello voltava de Dubai, nos Emirados Árabes, quando foi preso em Bogotá, na Colômbia, durante uma ação da Delegacia de Homicídios da Capital da Polícia Civil e do Gaeco/MPRJ, em janeiro de 2022. Na difusão vermelha da Interpol o nome do bicheiro era classificado como “perigoso” e “violento” ao ser tido, à época, como um fugitivo procurado.

Bello foi solto quatro meses depois após o Superior Tribunal de Justiça (STJ) conceder um habeas corpus para que o bicheiro respondesse ao processo em liberdade. Na época, foi determinado que ele se apresentasse à Justiça de dois em dois meses e ficasse proibido de sair de casa sem autorização ou de se mudar de endereço. O MP, no entanto, acusou Bello de descumprir as medidas cautelares impostas desde o fim de novembro de 2022, quando passou a ser considerado foragido em outro processo respondido por ele. Ele não foi encontrado pela polícia até o momento.

Na ocasião, ele foi acusado de ser um dos chefes da contravenção no Rio e foi alvo da Operação Fim de Linha, do Ministério Público estadual, que teve como foco a repressão a crimes de corrupção e de lavagem de dinheiro proveniente da exploração de jogos de azar. À época, ele não foi localizado.

Bernardo Bello é acusado de comandar diferentes esquemas de lavagem de dinheiro, envolvendo gasolina, diesel, carnes, carvão e temperos para churrasco, calças, bermudas e camisetas. Em março do ano passado, agentes deflagraram uma operação que mirou a Zé do Churrasco Indústria e Comércio de Alimentos, na Penha, Zona Norte do Rio. Foi onde houve um conflito de interesses que resultou na morte do advogado Carlos Daniel Dias André, ex-policial civil.

No quadro societário da empresa, era o nome de Marcelo Magalhães que constava como sócio-administrador. No entanto, de acordo com investigações, quem realmente tocava o negócio era Allan Diego Magalhães Aguiar, ex-cunhado de Bello que está preso. Criada no quintal de uma casa, a Zé do Churrasco teve uma movimentação financeira de R$ 22 milhões em apenas oito meses.

Os sócios brigaram, e Carlos Daniel intermediava um acordo, mas, segundo a Polícia Civil, Bello considerou que ele traiu sua confiança. O advogado foi morto em maio de 2022, e o contraventor passou a ser considerado suspeito de envolvimento no crime.

Entre os outros estabelecimentos nos quais investigadores fizeram buscas está uma pequena confecção que, aberta com um capital declarado de R$ 100 mil, faturou R$ 70 milhões em sete meses de 2021, durante a pandemia de Covid-19. Também foi cumprido um mandado em um posto de combustíveis que, localizado em Coelho da Rocha, na Zona Norte carioca, seria uma espécie de QG do grupo de Bello.

Peixão

Família do traficante Álvaro Malaquias Santa Rosa, o Peixão (foto), é flagrada tentando ir para a Bolívia; jóias foram apreendidas na ação

Reprodução e Divulgação / PRF

Álvaro Malaquias Santa Rosa, o Peixão, de 38 anos, é um dos criminosos mais procurados do Rio de Janeiro. Conhecido pelo perfil violento, Peixão nomeou de Complexo de Israel as cinco primeiras comunidades que dominou: Vigário Geral, Parada de Lucas, Cidade Alta, Pica-Pau e Cinco Bocas — um território vigiado por cerca de 200 fuzis. Em março, a PF descobriu que ele e sua quadrilha encomendavam armas e equipamentos ilegais online para serem entregues em casa.

Para marcar seu território, o criminoso costuma usar a bandeira de Israel e frases da Bíblia pintadas nos muros. O perfil violento do bandido é conhecido pelos investigadores. Segundo a polícia, ele costuma punir seus inimigos com a morte e é um obstinado quando se trata de infiltrados. Ele foi o primeiro a introduzir o uso de drones para vigilância em suas áreas, a fim de acompanhar a movimentação da polícia e dos concorrentes.

A dificuldade em encontrar o criminoso tem vários motivos. Além de forte poder bélico, que faz uso até de drone para vigiar a polícia e lançar granadas em inimigos, a quadrilha do Peixão espalha barricadas por todas as favelas.

Em fevereiro, as polícias Civil e Militar montaram uma operação de emergência para prendê-lo após receberem a informação de que ele estava escondido em uma casa na Cidade Alta, em Cordovil, na Zona Norte do Rio. A ação levou um caos aos moradores da região. A Avenida Brasil precisou ser fechada e quatro pessoas foram baleadas.

Em janeiro, o ex-porta-voz da PM foi exonerado do comando do 2º BPM (Botafogo) após se envolver em uma confusão em busca do traficante em um prédio na Zona Sul do Rio. O tenente-coronel teria recebido a informação de que o Peixão estaria no local para visitar o pai, um idoso de 70 anos. Não houve confirmação se o homem realmente morava no condomínio.

Em outubro do ano passado, a PM precisou recuar de uma operação no Complexo de Israel após um tiroteio na Avenida Brasil deixar três mortos e três feridos. Na época, autoridades das forças de segurança informaram que os agentes chegaram próximo de um alvo importante para a comunidade. Por isso, segundo a PM, a reação dos criminosos foi de atirar em direção aos civis para desarticular a ação da polícia. Depois dessa ação, Peixão passou a ser investigado por terrorismo.

Iniciativa do governo

Denúncias anônimas sobre os foragidos podem ser realizadas pelos canais 190 e 197. Segundo a pasta, a iniciativa permite o intercâmbio de informações entre os estados e estimula a colaboração direta da população.

O novo site é um desdobramento do Programa Captura, uma articulação nacional cujo objetivo é a identificação, localização e prisão de criminosos considerados de alta periculosidade. O ministério informou que irá instalar uma célula operacional da organização no estado do Rio de Janeiro.

“A medida responde à constatação de que criminosos de diferentes regiões do Brasil frequentemente se ocultam em áreas do estado fluminense. A nova estrutura permitirá apoio direto às polícias estaduais e maior agilidade na troca de informações para a localização de foragidos”, aponta a pasta.