Infecções na Faixa de Gaza estão ‘fora de controle’ em meio à demora na entrega de ajuda humanitária
A propagação de doenças infecciosas na Faixa de Gaza está "fora de controle", alertou a Organização Mundial da Saúde (OMS), que classificou o colapso do sistema de Saúde no território como “colossal”. O alerta ocorre em meio à escassez de ajuda humanitária e à lentidão na entrada de comboios com alimentos e medicamentos no enclave, uma semana após o início do cessar-fogo entre Israel e o Hamas.
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Segundo a diretora regional da OMS para o Mediterrâneo Oriental, Hanan Balkhi, apenas 13 dos 36 hospitais de Gaza funcionam parcialmente, e o acesso ao território continua restrito.
— A propagação de doenças infecciosas ficou fora de controle, seja meningite, síndrome de Guillain-Barré, diarreia ou doenças respiratórias — afirmou Balkhi, em entrevista à AFP. — O sistema de Saúde foi desmantelado, e a magnitude da tarefa é colossal.
Cercada por Israel e devastada por dois anos de guerra, iniciada após o ataque do Hamas em 7 de outubro de 2023, Gaza enfrenta uma crise sanitária sem precedentes. De acordo com dados da OMS, atualmente, a Cidade de Gaza conta com apenas oito centros de saúde em funcionamento parcial, todos com falta de médicos e equipamentos "para atender casos críticos". No norte, há apenas um centro ativo.
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A ONU registrou mais de 800 ataques a instalações de Saúde desde o início do conflito. Segundo um relatório recente da OMS, um quarto dos feridos — cerca de 167 mil pessoas — sofre de incapacidades permanentes, e um quarto dessas vítimas são crianças. A demanda por apoio psicológico também escalou: as necessidades de saúde mental mais do que dobraram, mas os serviços disponíveis “não atendem à demanda”.
Atrasos na ajuda agravam crise
Enquanto doenças se espalham, a ajuda humanitária chega em ritmo muito inferior ao necessário. Segundo o jornal britânico Guardian, o Programa Mundial de Alimentos (PMA) da ONU tem conseguido levar apenas 560 toneladas de alimentos por dia, número ainda distante do mínimo considerado adequado.
— Ainda estamos abaixo do que precisamos, mas estamos chegando lá — disse a porta-voz do PMA, Abeer Etefa. — O cessar-fogo abriu uma pequena janela de oportunidade, e o PMA está agindo muito rápido para aumentar a assistência alimentar.
Mesmo assim, menos da metade dos 600 caminhões previstos por dia consegue cruzar a fronteira. Longas filas se formam no posto de Kissufim, um dos poucos pontos de entrada entre Israel e Gaza, onde motoristas aguardam horas sob o calor até a liberação. Ainda de acordo com o jornal britânico, restrições sobre o que pode ser transportado também obrigam comboios a retornarem.
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Durante a guerra, Israel bloqueou rotas de entrada e saída, interrompendo o acesso a alimentos e medicamentos, o que levou à fome de 500 mil pessoas, declarada pelas Nações Unidas, em várias áreas do território. A ONU afirma que reverter esse quadro “levará tempo” e pede a abertura de todos os pontos de passagem.
— Atualmente, dispomos de cinco pontos de distribuição operacionais; nosso objetivo é chegar a 145, para inundar Gaza de comida — disse Etefa, em entrevista em Genebra.
O PMA informou, no entanto, que ainda não conseguiu iniciar as distribuições na Cidade de Gaza devido ao fechamento contínuo das passagens de Zikim e Erez, no norte, onde a crise é mais aguda. Caminhões carregados com farinha e alimentos prontos, ainda segundo Etefa, enfrentam estradas danificadas e bloqueios no sul do território.
Cessar-fogo sob tensão
O acordo de trégua, mediado pelos Estados Unidos e assinado na semana passada entre Israel e o Hamas, havia alimentado esperanças de que a ajuda humanitária chegaria em larga escala a Gaza — mas as restrições impostas por Tel Aviv permanecem. Dezenas de milhares de toneladas de suprimentos seguem retidas em países vizinhos, como Egito e Jordânia.
Israel acusa o Hamas de violar o cessar-fogo ao não devolver todos os corpos de reféns mortos, enquanto o grupo islamita afirma que precisa de equipamentos para recuperar os restos mortais que ainda estão sob escombros. Segundo a Defesa Civil de Gaza, controlada pelo Hamas, cerca de 10 mil corpos permanecem soterrados entre os 60 milhões de toneladas de destroços espalhados pelo território. A Turquia, por sua vez, enviou equipes especializadas em resgate para ajudar na busca.
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Em entrevista à rede americana CNN, o presidente dos EUA, Donald Trump, disse que consideraria permitir que Israel retomasse os combates caso o Hamas descumpra sua parte do acordo.
— Israel retornará às ruas assim que eu disser. Se Israel pudesse entrar e acabar com eles, eles fariam isso — afirmou Trump.
Já Balkhi, da OMS, reforçou o apelo pela transferência de feridos graves para a Cisjordânia ou países vizinhos para receberem atendimento médico adequado.
— Esperamos verdadeiramente que a paz dure para que possamos começar a trabalhar — declarou.
(Com AFP)
