
Horário de verão não faz sentido; entenda por que ele nunca deveria voltar

Todo ano, essa conversa renasce: o horário de verão vai voltar ou não? A resposta é simples — não deveria voltar nunca mais. A lógica que justificava adiantar os relógios em uma hora para “economizar energia” ficou no passado. Os hábitos de consumo mudaram, a matriz energética brasileira se transformou, e os próprios dados oficiais mostram que o impacto hoje é insignificante. O que fazer quando eletrodomésticos queimam com voltagem errada O que é e como funciona um filtro de linha? Durante o programa Bom Dia, Ministro, o titular da pata de Minas e Energia, Alexandre Silveira, foi categórico: “Estamos completamente seguros de que não precisamos do horário de verão neste ano”. Ele explicou que o Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico avalia mensalmente a segurança energética e, segundo os dados mais recentes, o país está em “condição de segurança energética completa e absoluta”. -Entre no Canal do WhatsApp do Canaltech e fique por dentro das últimas notícias sobre tecnologia, lançamentos, dicas e tutoriais incríveis.- O mito da economia de energia O argumento histórico para o horário de verão era a economia de energia no início da noite — quando a população chegava em casa e ligava luzes, TVs e eletrodomésticos. A lógica funcionava em um país com forte dependência de iluminação artificial e sem aparelhos de ar-condicionado em massa. Só que isso mudou. Brasil produz mais energia do que precisa, deixando horário de verão sem utilidade(Imagem Reprodução: Couleur/Pixabay) Um estudo do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) mostrou já em 2024 que, mesmo em cenários otimistas, o horário de verão geraria uma economia de até R$ 400 milhões no sistema elétrico durante toda a sua vigência — o equivalente a cerca de R$ 4 por domicílio brasileiro (considerando aproximadamente 90 milhões de lares). Em termos individuais, é uma economia simbólica; no agregado, irrisória. Na prática, o horário de verão desloca o consumo de energia para outros horários do dia, sem reduzir o total. O que se economiza em iluminação é compensado pelo aumento do uso de ar-condicionado nas manhãs mais quentes — justamente porque o sol passa a nascer mais tarde. Pesquisas similares feitas no Brasil, na Ásia e na Europa convergem nesse ponto: o benefício líquido tende a zero. Um país que produz energia de sobra Além de não gerar economia real, o horário de verão ficou obsoleto diante da nova matriz elétrica brasileira. O Brasil é uma potência em energias renováveis: mais de 90% da geração vem de fontes limpas, como hidrelétricas, eólicas e solares. Em algumas regiões, a oferta é tão alta que o sistema precisa desligar turbinas e parques solares temporariamente para evitar sobrecarga. O próprio ministro Silveira reconheceu isso ao afirmar que o país “produz muita energia, em especial, com o advento das energias renováveis”. Segundo ele, o desafio agora não é falta, mas armazenamento: “Vamos literalmente armazenar vento. O vento vai ser armazenado através das baterias”, explicou o ministro, referindo-se ao novo leilão de baterias que permitirá guardar energia eólica e solar para uso noturno. Ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, no programa Bom dia, Ministro, da EBC (Imagem:Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil) Em outras palavras, o problema que o horário de verão tentava resolver (a escassez de energia no pico da noite) simplesmente não existe mais. Hoje, o sistema nacional é robusto o suficiente para lidar com os picos de demanda —apesar de falhas recentes — sem precisar “mexer nos relógios” da população. Custos que superam os benefícios Do ponto de vista econômico, o ganho é desprezível; do ponto de vista social e de saúde, pode até ser prejudicial. Estudos já relacionaram o início do horário de verão ao aumentando casos de insônia e irritabilidade que acarretam vários outros problemas de saúde e até acidentes de trânsito. A University of British Columbia, no Canadá, constatou um aumento de 8% no número de acidentes de trânsito no dia seguinte à implantação do horário de verão, por exemplo. Isso sem mencionar o desconforto coletivo e o impacto em setores que dependem de sincronização com horários fixos, como transporte (aviação, especialmente) e educação. Se somarmos esses efeitos ao baixo retorno energético, uma eventual volta do horário de verão não faz o menor sentido, apesar de o ministro Silveira dizer que governo teria “coragem completa e absoluta de implementá-lo”. Essa fala pode indicar que o debate anual sobre o tema é mais político do que técnico. Apesar disso, Silveira reforçou: "estamos completamente seguros de que não precisamos do horário de verão". Mesmo o ONS, que tradicionalmente via o horário de verão como uma ferramenta de equilíbrio de carga, já reconhece que mudanças no perfil de consumo e a popularização de energias renováveis reduziram a relevância do programa. Um conceito que ficou no passado O horário de verão nasceu no início do século XX, em uma época de escassez energética e pouca automação. Era uma medida útil em um mundo sem celulares, sem energia solar e com consumo previsível. Mas em 2025, o Brasil é outro país: a geração renovável supera a demanda, o sistema elétrico é interligado e o custo marginal de operação caiu drasticamente. Mesmo quando apagões acontecem, eles não têm relação com falta de energia — e sim com falhas técnicas. Um exemplo recente foi o incêndio em um reator na Subestação de Bateias, no Paraná, que provocou uma interrupção temporária de cerca de 10 mil megawatts de carga, afetando todas as regiões do país. O próprio Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) confirmou que o problema foi pontual e operacional, e não uma questão de escassez energética. Em até uma hora e meia, a energia havia sido restabelecida na maior parte do sistema. Manter viva a ideia de que adiantar o relógio economiza energia é ignorar a evolução tecnológica e o novo perfil de consumo da sociedade. Hoje, a discussão mais relevante é como armazenar e otimizar a energia limpa que já temos, não como “enganar o relógio” para economizar centavos. Leia mais no Canaltech Verdades e mentiras sobre ar-condicionado: 8 pontos que você deve saber Blender substitui um liquidificador? Entenda usos da nova tendência LG anuncia fábrica de eletro mais cara do Brasil; veja os planos da marca Leia a matéria no Canaltech.