Holdings, offshores e empresas de fachada: a cadeia de ocultação de patrimônio da Refit

 

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A investigação realizada por promotores e auditores contra o grupo Refit, que culminou com uma megaoperação em cinco estados e no Distrito Federal, na quinta-feira (27), jogou luz em uma robusta rede de pessoas físicas e jurídicas, muitas das quais interpostas ou com vínculos societários cruzados, criada para o cometimento de crimes tributários. Após determinação judicial, um montante de R$ 10, 2 bilhões ligados a diversos integrantes do grupo foi bloqueado. Esse valor poderá ser usado como garantia de que impostos devidos possam ser pagos.

Segundo as análises do Ministério Público e da Receita Federal, o grupo Refit teria estruturado uma complexa teia empresarial (veja abaixo) voltada à blindagem patrimonial, cujo objetivo seria dificultar a identificação de ativos e bens passíveis de arresto judicial, como forma de prejudicar a recuperação de créditos tributários. Estima-se que a Refit e sua rede tenham sonegado R$ 9,8 bilhões de créditos de ICMS apenas em São Paulo.

A forma encontrada pelo grupo de Ricardo Magro, dono do grupo Refit, seria, segundo os investigadores, blindar o patrimônio por meio de holdings, offshores e shell companies (empresas de fachada), além de sucessivas reorganizações societárias. Todos esses meios têm como finalidade também proteger os proprietários de responsabilização direta. Para que a empreitada obtivesse êxito, dois instrumentos foram imprescindíveis: fundos de investimento e instituições de pagamento.

"O modus operandi da organização consiste no uso de empresas sucessoras (Fera, Flager, Império, Start, Orizona, etc.) e interpostas (Rodopetro) para burlar os Regimes Especiais de Oficio (REOs) impostos pela SEFAZ/SP (Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo) mantendo o fluxo de combustíveis e evitando o recolhimento do ICMS. Tais valores são então submetidos a atos de lavagem de capitais com a utilização coordenada de um núcleo financeiro (Yield, Euro, Gestão, Alpha) e de fundos de investimento para movimentar valores incompatíveis com o faturamento (movimentação de R$ 20 bilhões em SP), ocultar a origem ilícita dos recursos e proteger o patrimônio obtido com a fraude. Consta ainda o uso de holdings (Xoroque, Churchill) e de empresas imobiliárias (Athena Real State) para aquisições superfaturadas, além de sucessivas reestruturações societárias subscritas pelo núcleo jurídico (Magro Advogados), visando garantir a imunidade dos líderes e beneficiários", diz um trecho do documento assinado pela juíza Marcia Mayumi Okoda Oshiro, da 2ª Vara de Crimes Tributários, Organização Criminosa e Lavagem de Bens e Valores, responsável por determinar a operação de busca e apreensão.

Veja abaixo todas as empresas citadas na decisão judicial que autorizou as ações.

- Tiger Assessoria Empresarial S.A.: é empresa com papel duplo como prestadora de serviços e holding. dividindo endereço com o núcleo operacional. A empresa opera em locais críticos para a execução dos crimes: o complexo de Arujá/SP e o complexo de Duque de Caxias/RJ, indicando que a assessoria prestada é essencialmente o suporte logístico-operacional para a continuidade da distribuição irregular e sonegação. O nome "Assessoria Empresarial" é comumente utilizado pelo grupo para dissimular atividades de gestão e comando sobre as distribuidoras, mantendo o elo com o núcleo de comando.

- Tinis Participações S.A.: é uma das holdings de topo do grupo, essencial na blindagem patrimonial da família Magro. Divide endereço com a Magro Empreendimentos e Administração Ltda. em Guarulhos/SP, reforçando a confusão patrimonial entre a pessoa física da família magro e a pessoa jurídica. Como holding de participações, seu objetivo é separar a propriedade dos ativos (imóveis, cotas de outras empresas) do risco operacional das distribuidoras de combustível. É uma das empresas na base societária de controle de Ricardo Andrade Magro, operando como um canal de recebimento de proventos ilícitos (lucros distribuídos) para a família.

- Fit Participações S/A: anteriormente chamada Magropar Empreendimentos, é outra holding fundamental no contexto criminoso. A empresa opera no mesmo endereço da refinaria de Manguinhos, na Avenida Brasil, RJ, indício de seu papel na gestão dos proventos da atividade sonegadora. A alteração de nome de Magropar para Fit visa a dissimulação do vínculo familiar direto, sendo um mecanismo de blindagem patrimonial. A FIT detém participações em diversas empresas do grupo, atuando como a principal holding central na região do Rio de Janeiro, coordenando a gestão e o comando.

- Yield Financial Services S.A: é uma das empresas do núcleo Financeiro, dedicada à lavagem de dinheiro por meio de operações de factoring e crédito. A empresa atua como uma instituição financeira de fachada/apoio, realizando operações de crédito com as distribuidoras operacionais. Isso permite que o dinheiro da sonegação seja "limpo" ao circular como um empréstimo ou antecipação de recebíveis entre empresas do próprio grupo. O COAF identificou que a Yield Financial Services S.A transaciona volumes financeiros totalmente desproporcionais ao seu capital social, confirmando a instrumentalização para a lavagem de dinheiro, especialmente recebendo recursos de empresas de fachada. A Yield divide endereço com outras entidades do núcleo financeiro e possui administradores em comum com o núcleo de comando do grupo.

- Alpha Financial S/A: é outra instituição do núcleo financeiro, com função idêntica à YIELD. Atua em sinergia com a YIELD e outras empresas de factoring do grupo, executando a mesma manobra de branqueamento dos proventos ilícitos (fruto da sonegação de ICMS) através de operações financeiras internas. Sua localização em centro comercial de São Paulo facilita a aparência de uma operação lícita de factoring no mercado. А Alpha recebe recursos das distribuidoras operacionais em altos volumes, garantindo que o dinheiro sujo retorne ao sistema do grupo com aparência lícita.

- Churchill Investimentos e Borlange SP Participações S.A.: são holdings de blindagem patrimonial. dividindo endereço no mesmo conjunto que abriga a refinaria e o escritório do Magro Advogados Associados. A localização evidencia que elas não são meras holdings passivas, mas parte da estrutura de comando e proteção. Ao que o conjunto probatório indica, о objetivo dessas empresas é receber, gerir e ocultar o patrimônio adquirido com o provento da sonegação, dificultando a constrição judicial (sequestro de bens). Seu quadro societário ou administrador está ligado a Ricardo Andrade Magro ou a executivos de confiança do núcleo de comando.

- Fera Lubrificantes Ltda.: é a sucessora da dívida inicial. Seu quadro societário é composto por Manuel Joaquim Andrade (avô de Ricardo) e João Manuel Magro (pai de Ricardo). reforçando o caráter familiar e centralizado da gestão. Acumulou mais de RS 550 milhões em débitos de ICMS, assumindo as obrigações fiscais da refinaria após a cassação da IE-ST. 0 COAF identificou movimentação financeira de R$ 3,4 bilhões (entre débitos e créditos) com saldo da conta mantido em pequenos valores, e recebimento de recursos de contrapartes com capital social incompatível com os valores transacionados, indícios de lavagem de dinheiro.

- Flagler Combustíveis S.A.: é empresa espelho e braço operacional do grupo, utilizada para dar continuidade à sonegação fiscal após as restrições impostas à Fera. Ela opera em paralelo com a Fera, estando instalada no mesmo endereço em Arujá/SP, e possui mesma atividade, fornecedores e clientes comuns.

- Fidd Administracao de Recursos Ltda. e Fidd Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários Ltda.: atuam como as administradoras formais de todos os fundos do grupo, fornecendo o suporte técnico e legal para a constituição e movimentação dos veículos de investimento.

- Euv Spi Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (Fidc) e Saint-Tropez Fundo de Investimento em Direitos Creditórios: conforme indícios, aparentam ser os veículos de autofinanciamento e lavagem. Eles foram constituídos para comprar "créditos" das próprias distribuidoras operacionais do grupo, o que permite que o dinheiro da sonegação retorne à operação como pagamento de dívida ou sob a forma de empréstimo, em aparente manobra de branquamento. O Saint-Tropez foi usado em uma operação de cessão de crédito suspeita, com parecer do Magro Advogados, reforçando o uso do núcleo jurídico na fraude.

- Euv Master Fund Fundo de Investimento e La Rochelle Fundo de Investimentо: atuam como fundos-mãe (FIF), sendo os grandes caixas-fortes que centralizam o capital da Churchill Investimentos, controlada pela Família Magro e direcionam-no para os fundos operacionais, para remessa ao exterior e para os fundos de autofinanciamento como o EUV SPL.

- Euv Denali Fundo de Investimento em Participacões Multiestratégia e Euv Sp 2 Fundo de Investimento em Participacões Multiestratégia: são veículos de controle societário e aquisição de ativos.

- Euv Zeus Fundo de Investimento em Participacões Multi Investimento no Exterior: é o principal veículo para remessa de recursos ao exterior e lavagem internacional. O fundo enviou mais de US$ 200 milhões para a offshore Clearedge Capital LLC (constituída em Delaware sete dias antes do fundo), sob a forma de empréstimo (mútuo conversível), com o objetivo de retirar os lucros da sonegação do Brasil, com risco de prejuízo futuro simulado no balanço do fundo.

- Ecomar Fundo de Investimento em Participações Multiestratégia e Euv Gladiator Fundo de Investimento em Participações Multiestrategia: são fundos de expansão e ocultação patrimonial. O Ecomar investe em novas refinarias (Ecomar Refinarias), e o EUV Gladiator é o sócio da Athena Real Estate, que protagonizou a compra superfaturada de um imóvel (valorização de RS 684 mil para RS 65,5 milhões), elemento probatório destacado de lavagem de dinheiro.

- Matera Fundo de Investimento em Participações Multiestratégia, Amalfi Fundo de Investimento em Participações Multiestratégia, Ostuni (Fidc e Fim) e Positano Fundo de Investimento em Participações: são fundos mais recentes criados para substituir ou expandir o esquema. O Matera e o Amalfi demonstram a continuidade do vínculo com as offshores de Delaware e a aquisição de empresas que participaram da fraude. O Ostuni e o Positano compartilham o mesmo IP de criação do FEATBANK FIDC, indicando a mesma autoria digital no nascimento dos novos veículos de blindagem.

- Eurovest S.A., Eurovest Asset Management Ltda. e Eurovest Participações (Imobiliárias e Ltda): são outro centro de comando financeiro, sendo acionista de empresas e holdings que controlam os fundos. Sua movimentação financeira explodiu para R$ 72 bilhões a partir de 2024, quando assumiu a gestão financeira do Grupo Refit.

- Prime Factor Ltda. e Inova Investimentos e Consultoria Financeira Ltda.: a Prime Factos (sucessora da Alpha) é a nova gestora de caixa/cobrança do grupo, responsável por movimentar R$ 11,2 bilhões em 6 meses (valor incompatível com o faturamento). A Inova é a "conta bolsão" que concentra e mistura os recursos da Euro Gestão antes de repassá-los para a Refinaria Manguinhos, quebrando o fluxo e dificultando o rastreio contábil da origem do dinheiro.

- Featbank (Todas as 5 empresas: IP, Asset, Corretora, Cartão, Cobrança) e Euro Gestão Financeira S.A.: são a estrutura paralela de pagamentos (fintechs e factoring) do grupo, com 95% a 100% do seu faturamento em serviços intragrupo. O objetivo é burlar o sistema antilavagem (gatekeeper) com "contas bolsões".

- Magro Advogados Associados: é o escritório de Ricardo Andrade Magro. Não atua apenas na representação, mas sim na blindagem jurídica e financeira do grupo. O escritório cedeu crédito para empresas do grupo e emitiu legal opinion em operações fraudulentas de fundos (SAINTTROPEZ FIDC). 85,10% do seu faturamento foi proveniente de serviços intragrupo, confirmando sua instrumentalização ilicita.

- Roar Inovação e Informação Ltda: é a empresa de tecnologia controlada por Ricardo Mageo, atuando como braço tecnológico gestor de ativos intangíveis. A Roar desenvolveu o ecossistema digital (sites, fintechs, a marca GULF) e, crucialmente, utiliza os IPs centrais (187.0.201.98/102) para emitir notas fiscais de diversas distribuidoras, comprovando o comando unificado à distância.

- Churchill Investimentos S.A.e Borlange SP Participações S.A.: holdings cotistas principais dos Fundos de Investimento (EUV MASTER, EUV ZEUS) e atuavam como gestoras de caixa do Grupo (junto com a YIELD). São o elo entre os lucros da sonegação e os veículos de lavagem (fundos e offshores).

- Edrosa Consultoria: é empresa patrimonial família Magro, utilizada para acumulação de patrimônio (10 imóveis). Citada pelo COAF por movimentação com a YIELD.

- Gulf Oil do Brasil Ltda: fachada comercial para escoar combustível da refinaria. Embora seja uma marca internacional, a operação brasileira e o domínio digital são controlados pela Roar (Ricardo Magro), confirmando a instrumentalização.

- Sheridan Resources Holding S.A.: possui vínculo com a rede de offshores em Delaware (EUA). Seu contador está ligado à EUROVEST e o CEO está ligado à Ecomar Refinaria, indicando sua participação na estrutura de blindagem internacional.

- Magro Empreendimentos e Administração Ltda. e Tinis Participações S.A.: são holdings do núcleо familiar e patrimonial, utilizadas para gerir os bens da família Magro, operando no mesmo local, a reforçar a blindagem e a confusão patrimonial.

Todas as empresas citadas foram procuradas por meio do escritório de advocacia de Ricardo Magro e pela assessoria de imprensa da Refit, mas não se pronunciaram. O espaço segue aberto.