Executivos americanos seguem Trump e não participam da COP30 em Belém
Esta é a primeira vez em 15 anos que os altos funcionários do governo dos Estados Unidos estão faltando à cúpula anual do clima das Nações Unidas e muitos executivos corporativos americanos seguram o mesmo caminho. Embora poucos empresários do país tenham feito coro com o presidente dos Estados Unidos Donald Trump, que chamou as mudanças climáticas de farsa, a maioria sinaliza que que talvez o tema não mereça tanta atenção quanto vinha recebendo, já que optaram por não participar da COP30, que acontece essa semana em Belém, no Pará.
A atitude deles não é exatamente de negação climática, mas sim uma rejeição à forma como a questão foi tratada no passado. A sinalização indica uma mudança drástica em relação à postura de engajamento e compromisso adotada pelo grupo em cúpulas anteriores, realizadas sob outras condições políticas nos EUA.
Os líderes das maiores empresas americanas já prometeram reduzir a poluição, formaram coalizões para financiar a transição energética e pediram a aprovação de leis para reduzir as emissões que aquecem o planeta. Mas, neste ano, na cúpula climática da ONU, nenhum líder corporativo americano de destaque compareceu.
— Obviamente, isso tem a ver com o clima político nos Estados Unidos —, disse Sonia Dunlop, diretora-executiva do Global Solar Council, uma organização do setor de energia solar.
Em edições anteriores da conferência, participaram CEOs influentes como Tim Cook (Apple), Darren Woods (Exxon) e Brian Moynihan (Bank of America). A ausência de figuras como essas tem sido interpretada pelos participantes como mais uma confirmação de que os Estados Unidos, sob o governo Trump, desviaram sua atenção dos esforços climáticos.
Woods esteve na sexta-feira em um evento em São Paulo patrocinado em parte pela Câmara de Comércio dos EUA, mas deixou de comparecer à cúpula de Belém, após ter participado de encontros anteriores em Baku (Azerbaijão) e Dubai (Emirados Árabes Unidos).
— Nossa empresa e, de forma mais ampla, o setor não discorda dos objetivos globais em relação às emissões —, disse Woods no evento em São Paulo, acrescentando: — Acho que nosso desafio, e onde há muito mais debate, é sobre como pretendemos alcançar esses objetivos.
Segundo ele, o desafio da humanidade não deve ser “acabar com o petróleo e o gás”, mas sim eliminar “as emissões associadas à queima de petróleo e gás”.
Essa postura ficou evidente durante a conferência em Belém, enquanto o setor empresarial americano persente no evento tenta atravessar o que alguns descrevem como um campo minado. Um grande receio é que quem que se comprometer publicamente a enfrentar as mudanças climáticas possa acabar prejudicando suas empresas, ao provocar a ira de Trump e seus assessores. Desde que voltou ao cargo, em janeiro, o presidente americano tem desmontado agressivamente as políticas federais de combate às mudanças climáticas.
No primeiro dia de mandato, ele retirou os Estados Unidos do Acordo de Paris e declarou uma emergência energética, usada para justificar novos projetos de combustíveis fósseis. Desde então, seu governo enfraqueceu regulações ambientais, atacou o setor de energia renovável e estimulou a produção de carvão, gás e petróleo.
Neste ano, várias grandes empresas de tecnologia admitiram que não cumprirão suas metas climáticas por causa dos altos gastos energéticos dos data centers usados para inteligência artificial. Mesmo antes do início do segundo mandato de Trump, muitos dos maiores bancos e instituições financeiras do país já haviam abandonado suas alianças setoriais sobre o clima. E, muitos CEOs que criticaram o desmonte das políticas climáticas de Trump em seu primeiro mandato, preferiram o silêncio desta vez.
— Pode não valer a pena para um CEO vir à COP apenas para falar sobre o que sua empresa já está fazendo — disse Dan Carol, diretor sênior de finanças climáticas do Milken Institute, referindo-se ao nome oficial da cúpula da ONU, Conferência das Partes (COP).
Algumas grandes empresas americanas, ao invés dos CEOs, enviaram outros representantes à Belém: os diretores de sustentabilidade do Google, Microsoft, Amazon e Mastercard estiveram presentes. Mas, por exemplo, o grupo de Carol, uma organização de pesquisa criada por Michael Milken, o financista de títulos que foi perdoado por Trump, organizou um simpósio de investidores em clima no domingo e na segunda-feira, em São Paulo, a mais de 2.400 quilômetros de Belém. Foi um dos vários eventos corporativos relacionados ao clima realizados em Rio de Janeiro e São Paulo, as duas metrópoles cosmopolitas do sul do Brasil.
Alguns executivos do setor de energia, como Woods, da Exxon, participaram desses encontros em vez da cúpula. Além do fator Trump, os visitantes enfrentaram a escassez de vagas em hotéis e limitações de infraestrutura em Belém. Carol disse que os investidores continuam interessados em projetos de redução de emissões de gases de efeito estufa, mas os tipos de investimento estão mudando à medida que a influência da Casa Branca molda as conversas no Brasil.
Mudança de tom
Um exemplo de como os executivos têm mudado seu discurso veio no mês passado, com um memorando de Bill Gates, cofundador da Microsoft. Nele, Gates alertava contra o “alarmismo climático” e afirmou que isso “não levará à extinção da humanidade”. Muitos interpretaram como uma reversão de suas antigas posições sobre o tema, e Trump e diversos republicanos aproveitaram para reivindicar a fala como uma vitória política.
Poucos dias antes da cúpula em Belém, no entanto, Gates declarou no Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech) que qualquer sugestão de que ele havia mudado de opinião era “uma leitura completamente errada do memorando”. O empresário disso ainda que pretende investir mais dinheiro em mitigação climática.
— Eu não achei que o memorando fosse converter os descrentes em crentes — e, de fato, não converteu — disse ele.
A tentativa de Gates de esclarecer sua posição apenas reforçou as preocupações de líderes mundiais e ambientalistas de que os executivos estão recuando sob pressão do governo Trump. A Casa Branca minimizou a importância da reunião em Belém:
— O presidente Trump não colocará em risco a segurança econômica e nacional do nosso país para perseguir metas climáticas vagas que estão destruindo outras nações — disse Taylor Rogers, porta-voz da Casa Branca, ao The New York Times neste mês.
Reações e ausências
Sebastian Buckup, diretor-gerente do Centro de Natureza e Clima do Fórum Econômico Mundial, afirmou não acreditar que haja um “boicote motivado por posições políticas”. Mas observou que, à medida que o debate sobre o clima se torna mais rotineiro, “essas questões acabam descendo na hierarquia de prioridades das empresas”.
Entre os ausentes mais notáveis da cúpula deste ano estão executivos de grandes companhias de energia elétrica dos EUA.
Calvin Butler, presidente e CEO da Exelon e presidente do Edison Electric Institute, principal associação do setor, não compareceu por “conflitos de agenda”, segundo um porta-voz. Ele afirmou recentemente ao Times que continua comprometido em “levar nossas operações a emissões líquidas zero”.
Vários bancos de investimento e grandes empresas de tecnologia também enviaram executivos a eventos em São Paulo e Rio de Janeiro antes da conferência de Belém.
No evento do Milken Institute em São Paulo, na segunda-feira, o governador da Califórnia, Gavin Newsom, democrata, criticou duramente o governo Trump por se recusar a enviar representantes à cúpula. Ele disse estar “surpreso por nem todo maldito governador estar aqui” e afirmou que os executivos corporativos não deveriam recuar de eventos como a conferência climática, apesar da possível retaliação de Trump.
—Vamos reagir— garantiu Newsom, antes de seguir para Belém.
Na abertura da reunião de líderes que precede a cúpula principal da ONU, o ex-prefeito de Nova York Michael Bloomberg anunciou novos investimentos para enfrentar os problemas climáticos. Sua fundação, Bloomberg Philanthropies, prometeu US$ 100 milhões para acelerar os esforços de redução de emissões de metano — um dos gases de efeito estufa mais potentes.
Executivos de outros países também compareceram a Belém, entre eles o bilionário australiano Andrew Forrest, fundador da mineradora Fortescue, que recebeu convidados em seu barco movido a amônia, que emite menos poluentes que embarcações tradicionais. O ex-vice-presidente Al Gore estava entre os presentes.
Forrest afirmou ter ido à reunião da ONU para demonstrar que ainda há líderes empresariais comprometidos em combater as mudanças climáticas. Ele lamentou que um acordo internacional para reduzir as emissões do setor naval tenha sido frustrado por “um certo presidente que não quer ser desmentido pelo resto do mundo” — uma referência à administração Trump, que bloqueou as negociações.
Mesmo assim, Forrest disse estar otimista: a economia da energia limpa está evoluindo, e as próximas décadas deverão trazer reduções rápidas nas emissões que aquecem o planeta.
— A história sempre entrega — afirmou, ainda pontuando: —No fim, o certo prevalece.
