Ex-goleiro Doni, de Corinthians, Roma e Seleção, é alvo de processos por dívidas milionárias nos EUA
Ex-goleiro de Corinthians, Santos, Cruzeiro, Roma (Itália), Liverpool (Inglaterra) e Seleção Brasileira (no elenco da Copa de 2010), Donieber Alexander, o Doni, é alvo de processos e acusações de golpe nos Estados Unidos devido à atuação como empresário do ramo da construção civil no estado da Flórida.
Junto de um sócio, chamado Werner Macedo, também brasileiro, Doni captava recursos com pessoas e empresas no Brasil e no exterior, sob a promessa de rendimentos de até 15% ao ano, para construir casas em condomínios na Flórida. A maioria dos empreendimentos, no entanto, nunca saiu do papel. Procurados ao longo de duas semanas, Doni e Macedo não se pronunciaram para a reportagem.
O site e os portfólios da WD Invest, uma das empresas em nome de Doni e Werner, anunciam diversos desses empreendimentos imobiliários de médio e alto padrões. É o caso do Camila Homs, em Silver Springs Shores, a uma hora e meia de Orlando. O empreendimento, lançado em 2022, teria 529 casas e incluiria um campo de golfe "perfeito para famílias que buscam uma melhor qualidade de vida", segundo a propaganda à época.
Para viabilizar a empreitada, Doni fechou diversas parcerias com investidores, entres os quais o jogador Willian Arão, ex-Flamengo e atualmente no Santos. Em 4 de novembro de 2022, Arão celebrou um acordo comercial com a D32 Holdings — a principal empresa do grupo do ex-goleiro — e contribuiu com US$ 200 mil (R$ 1,07 milhão em valores atuais) sob o compromisso de receber 1,14% de participação no empreendimento, mais 15% do montante investido em um prazo de 18 meses.
A defesa de Arão, no entanto, afirma que o projeto foi abandonado, sem que isso fosse informado aos investidores. "De 2022 a 2024, os réus enviaram relatórios financeiros falsos indicando retorno superior a US$ 264 mil (cerca de R$ 1,4 milhão hoje), embora o projeto estivesse parado ou abandonado. Eles não notificaram os autores sobre a paralisação do projeto e continuaram a ocultar informações. Em janeiro de 2025, em reunião em Orlando, os réus admitiram que o projeto não seguiria adiante e sugeriram migração do investimento para outro projeto, mas depois recuaram", afirma a defesa de Arão em processo movido contra Doni, Macedo e a D32 Holdings no tribunal de Orange, na Flórida, no qual pede uma indenização de US$ 264 mil. Procurado, Arão não se pronunciou.
De Ribeirão Preto à Kings Landing
Em outra ação ajuizada em Orlando, um grupo de 12 investidores de Ribeirão Preto (SP), cidade onde Doni surgiu para o futebol em 2001, investiu US$ 1,6 milhão (R$ 8,5 milhões) no empreendimento Kings Landing, um condomínio de 50 casas geminadas que seria construído sobre um terreno de 36 mil metros quadrados na Flórida. "Ideal para famílias que buscam uma área tranquila com fácil acesso ao centro de Orlando", dizia o anúncio. As negociações se iniciaram em dezembro de 2022 e foram até março de 2023, quando os cotistas formalizaram os acordos.
Segundo o processo, o grupo de Doni usaria parte do recurso aportado para comprar o terreno (US$ 1,2 milhão) e o restante seria utilizado na obtenção de licenças municipais e no início das obras. Como garantia aos investidores, seria ofertado justamente o terreno. A expectativa de retorno aos investidores era de no mínimo 65%, segundo as promessas do ex-goleiro.
A reportagem conversou com parte dos investidores da Kings Landing. Um deles, que aportou US$ 100 mil dólares (R$ 537 mil) e pediu para não ser identificado, diz que o Doni teria afirmado em reuniões que os lucros poderiam chegar a 86% em até dois anos. A desconfiança do grupo começou a aparecer após algumas visitas ao terreno, que estava intocado enquanto o ex-goleiro afirmava que a obra já se iniciara. Os investidores, então, souberam que o terreno também havia sido dado como garantia bancária antes do contrato assinado.
"Após os investimentos, os autores constataram que a escritura de transferência do imóvel não havia sido registrada nos registros públicos do Condado de Orange. A propriedade estava gravada com hipoteca no valor de US$ 9 milhões, registrada em janeiro de 2023, mas tal ônus nunca fora revelado aos investidores" afirmam os investidores, na ação.
Despejos e outras ações nos EUA
Além dos dois processos, Doni também é ou foi alvo de outras disputas jurídicas, como um despejo do escritório do grupo, em Orlando, cujos alugueis mensais de US$ 10.967 não foram pagos no início de 2024. Depois disso, em junho de 2025, a firma foi novamente despejada de um prédio comercial na mesma cidade. Nesse caso, o débito passou de US$ 170 mil (R$ 912 mil). Com as restrições, Doni e seu sócio teriam passado a ocupar um coworking, também em Orlando.
Há ainda demandas jurídicas sobre o fornecimento de banheiros químicos para obras (US$ 24 mil, cerca de R$ 128 mil), e uma ação movida por um cantor sertanejo brasileiro que investiu US$ 300 mil (R$ 1,6 milhão) em junho de 2023, mas até agora não obteve nenhum tipo de retorno.
A reportagem conversou também com outros dez investidores, no Brasil e no exterior, que ainda não entraram com ações contra Doni, seu sócio e suas empresas. Um deles, que investiu mais de US$ 350 mil a partir de 2022, afirma que percebeu no ano seguinte que a empreitada não saíra como o planejado. Segundo relato do empresário, que mora no interior de São Paulo, o ex-jogador solicitou que ele e outros credores assinassem documentos posteriores para que as dívidas fossem transferidas, mas as conversas nunca avançaram.
De jogador a empresário
No portfólio de uma de suas empresas, o ex-goleiro mantém suas apresentações como investidor e construtor. "Após muitos anos como jogador de futebol profissional, incluindo defender a Seleção Brasileira, vivendo e trabalhando em diversos países, como Brasil, Inglaterra e Itália, Donieber Alexander Marangon, mais conhecido como Doni, começou a investir em diferentes mercados, como construção, entretenimento e negócios esportivos, ainda enquanto jogava futebol. Depois que se aposentou do esporte, Doni imigrou para os Estados Unidos e, após pesquisar o mercado, decidiu fundar a D32 Builder, onde viu uma oportunidade de causar um impacto significativo no mercado imobiliário e de investimentos", diz um dos materiais promocionais.
Além dessas atividades, Doni e Werner, por meio da D32 Invest LLC, também representam dezenas de investidores, incluindo jogadores de futebol, empresários e artistas em empresas voltadas a estrangeiros e com estruturas de offshore.
Como jogador, Doni começou a carreira no Botafogo de Ribeirão Preto (SP), em 2001. Nos dois anos seguintes, atuou pelo Corinthians. Após 101 jogos pela equipe paulistana, Doni jogou por Santos (2004), Cruzeiro (2004 e 2005), Juventude (2005), Roma (2005 a 2011) e Liverpool (2011 e 2012). Pela seleção, fez dez jogos, entre 2007 e 2010.
Em 2013, quando voltaria ao Botafogo de Ribeirão Preto para encerrar a carreira, Doni descobriu um problema cardíaco e parou de jogar profissionalmente. Em 26 de outubro, quando o goleiro completou 46 anos, a Roma prestou uma homenagem a ele.
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Doni e Macedo, seu sócio brasileiro, não quiseram se pronunciar mesmo após insistentes contatos da reportagem. O ex-goleiro chegou a responder às mensagens do GLOBO, disse que concederia entrevista e que estava em vias de reestruturar suas empresas, mas a conversa nunca ocorreu. O espaço segue aberto.
