Em meio a alta de feminicídios, Tarcísio propõe orçamento menor para Secretaria de Mulheres, chefiada por Valéria Bolsonaro

 

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O estado de São Paulo teve 207 casos de feminicídio entre janeiro e outubro, um aumento de 6% sobre o mesmo período do ano passado, enquanto o registro de agressão contra mulheres aumentou 8% no período. Mesmo assim, a gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) propôs um orçamento menor para a Secretaria de Políticas para a Mulher em 2026 na comparação ao que a secretaria tem em 2025, ao mesmo tempo em que a pasta chega a dezembro sem ter aplicado todos os recursos que tinha disponível para as ações de enfrentamento à violência contra a mulher.

Ainda na transição do governo, em novembro de 2022, Tarcísio anunciou a criação da Secretaria de Políticas para a Mulher, uma promessa que fez durante a campanha eleitoral. Desde o primeiro ano de mandato, a área sempre foi comandada pelo PL.

A vereadora Sonaira Fernandes (PL) chefiou a pasta entre janeiro de 2023 e abril de 2024, quando deixou o cargo para reassumir a cadeira na Câmara Municipal e concorrer à reeleição. Desde então, a titular é Valéria Bolsonaro (PL), deputada estadual licenciada, que carrega o sobrenome do ex-presidente da República por ser casada com um primo de segundo grau de Jair Bolsonaro (PL) — o avô do seu marido era irmão do avô do ex-presidente.

Na proposta de Lei Orçamentária de 2026 enviada à Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), o governador separou R$ 16,5 milhões para a Secretaria de Políticas para a Mulher. Na prática, é uma redução de 54% em relação ao valor aprovado pela Alesp para 2025, que foi de R$ 36,2 milhões. O governo argumenta que a proposta foi um aumento em relação aos R$ 9 milhões que o próprio Executivo havia sugerido para 2025, orçamento que ficou maior após as emendas dos deputados. Assim, um aumento real nos recursos para o ano que vem, em comparação ao que a pasta já tem neste ano, depende das emendas dos parlamentares. O projeto de lei orçamentária deve ser votado na semana que vem.

Ao longo de 2025, a situação orçamentária da área enfrentou contingenciamentos e problemas de execução, e no início do ano houve um congelamento de recursos, que posteriormente foi liberado.

Do total das verbas da secretaria, R$ 10 milhões seriam destinados somente ao programa de enfrentamento a violência contra a mulher. Agora, o orçamento atual é de R$ 8 milhões nesse programa. Mesmo assim, não houve aplicação de todo o dinheiro: de acordo com dados da execução orçamentária da Secretaria Estadual de Fazenda, até terça-feira (9), faltando menos de um mês para o fim do ano, somente R$ 2,6 milhões haviam sido empenhados. Na secretaria como um todo, o empenho foi de R$ 22 milhões, ou seja, cerca de 60% de todo o orçamento inicial.

Em 2024, a secretaria já havia sofrido com cortes de verbas, passando de R$ 24 milhões no início do ano para R$ 15 milhões ao longo do exercício — mesmo assim, o empenho não ultrapassou os R$ 10 milhões.

A falta de investimentos nessa área não passou despercebido pela oposição, que tem criticado publicamente as medidas de Tarcísio e até levado a preocupação para outros órgãos. A deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP) fez uma representação no Tribunal de Contas do Estado (TCE-SP) denunciando o baixo investimento nas Delegacias da Mulher e nas políticas de prevenção à violência contra a mulher, e pediu que a Corte faça uma auditoria nas delegacias e equipamentos e acolhimento de mulheres no estado. Ainda não houve decisão.

No ato Mulheres Vivas realizado no último domingo, na Avenida Paulista, ativistas e parlamentares fizeram discursos criticando diretamente Tarcísio e Valeria Bolsonaro pelos contingenciamentos, e houve gritos de “fora, Tarcísio” entre a multidão que ocupava a avenida.

Para 2026, além do orçamento na secretaria dedicada às mulheres, a gestão Tarcísio ainda instituiu uma política de auxílio para mulheres vítimas de violência, que soma R$ 24 milhões em investimentos previstos, mas é a Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social quem vai cuidar dessa ação.

O governo afirmou, em nota, que existe uma “política intersecretarial para garantir a segurança, a saúde e a autonomia financeira das mulheres” no estado e que as ações são feitas com recursos da Segurança Pública, Saúde, Desenvolvimento Social, Desenvolvimento Econômico e a Secretaria de Políticas para Mulher, “responsável por coordenar esse trabalho de forma transversal desde a sua criação, em 2023”.

Segundo a gestão Tarcísio, esse modelo “amplia o investimento total em ações de apoio e proteção às mulheres, garantindo o uso eficiente dos recursos públicos e impacto efetivo das políticas públicas, com o objetivo de fortalecer a rede de proteção, autonomia e segurança das mulheres no Estado”. Algumas das ações citadas pelo governo são o Protocolo Não se Cale, o App Mulher Segura, a Cabine Lilás, as Casas da Mulher Paulista, a tornozeleira eletrônica para agressores de mulheres e o auxílio-aluguel para mulheres vítimas de violência doméstica.

“Em relação ao orçamento específico da SP Mulher, importante esclarecer que na PLOA 2025, estavam previstos R$ 9,6 milhões. Ao longo do ano, a Pasta recebeu emendas impositivas e suplementações. Até o momento, já empenhou R$ 22 milhões, dos quais R$ 15 milhões já foram executados Na PLOA 2026, o orçamento previsto é de R$ 16,5 milhões, valor 70% superior ao proposto em 2025, sem contar as eventuais suplementações e emendas”, acrescenta a gestão.

Na área da Segurança Pública, a gestão Tarcísio ainda patina para ampliar as Delegacias da Mulher (DDM), principalmente aquelas que funcionam 24 horas por dia. Uma lei federal sancionada por Lula (PT) em 2023 prevê que todas as delegacias de atendimento a mulheres devem funcionar de maneira ininterrupta, mas em São Paulo, apenas 18 funcionam a qualquer horário (oito na Região Metropolitana e dez em cidades do interior).

Segundo a Secretaria de Segurança Pública, houve aumento de 231% nos investimentos de proteção à mulher, em comparação à gestão anterior, e que os recursos destinados às Delegacias de Defesa da Mulher foram “aperfeiçoados” a partir de 2024 para englobar também o atendimento de outros públicos vulneráveis, como idosos, crianças e adolescentes. “Assim, para 2026, os recursos destinados as DDMs estão inseridos em programas que somam R$ 468,3 milhões, dos quais R$ 16,9 milhões destinados à melhoria de cinco DDMs (Itu, Sorocaba, Ribeirão Preto, São Vicente e Guarujá)”.

O governo afirma ainda que aumentou o número de Salas DDMs 24 com um atendimento remoto, em que uma funcionária atende as mulheres por videoconferência, nos locais em que não há uma sala DDM física. “Espaços desse tipo garantem acolhimento humanizado às vítimas de violência, pois há um ambiente reservado para atendimento remoto por meio de videoconferência com uma funcionária treinada da DDM Online, permitindo que a mulher registre a ocorrência e solicite medidas protetivas de urgência com agilidade e segurança, 24 horas por dia independente da região em que estiver”, explicou a pasta.