De estadia com parentes a viagem à Disney: como belenenses se viraram para lucrar alugando suas casas para a COP30

 

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Motivo de crise nos meses de preparativos para a COP 30, a hospedagem vem alterando a rotina de parte da população de Belém. Moradores que conseguiram alugar suas casas para participantes da conferência, nessa nova e temporária dinâmica, precisaram se mudar para apartamentos de parentes e amigos. Outros viajaram para casas de praia ou até para o exterior, devido aos contratos vantajosos.

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Depois do boom dos preços de Belém, mais ou menos no meio do ano, que assustou comitivas internacionais, muitos desses moradores relatam que só conseguiram fechar contratos já perto do evento, a preços menores do que o inicialmente esperado. Ainda assim, a renda extra veio a calhar. Uma das pessoas entrevistadas pelo GLOBO disse que conhece cerca de 30 famílias que viajaram para os EUA com o dinheiro obtido.

Desde que foi anunciado o período de férias escolares durante a COP30, a empresária Luana Gantuss e seu marido decidiram que fariam uma viagem com os dois filhos para eles conhecerem a Disney e o parque da Universal, em Orlando (EUA). O plano ainda ganhou um impulso quando uma imobiliária fez contato e intermediou a negociação de aluguel de 30 apartamentos do prédio em que moram para a Embaixada da França.

Luana e sua família alugaram o imóvel em que moram e embarcaram para a Disney

Álbum de família

-- Como já iríamos viajar no período, decidimos alugar nosso apartamento junto com nossos vizinhos. A gente já ouvia falar nos aluguéis que estavam acontecendo, mas não fomos atrás. Quando a imobiliária falou com a gente, achamos que seria interessante, e custeou a nossa viagem — comemora Gantuss, que disse que a negociação foi simples. — As exigências foram tranquilas, só precisavam de lençóis e toalhas novas, em bom estado.

Dos EUA, Gantuss diz que acompanha as notícias sobre a COP, e que os comentários que chegam são muitos:

— Estamos muito felizes que o evento esteja acontecendo. Com todos os problemas da nossa cidade, acho que está sendo um evento muito legal

A moradia temporária fora de casa gerou férias antecipadas, mas também casos de perrengues, devido à nova rotina. Simone de Deus, por exemplo, precisou trocar a distância de apenas três minutos de casa até trabalho para cerca de uma hora e meia no trajeto. Isso porque ela alugou seu apartamento em Icoaraci, próximo ao Porto do Outeiro, onde estão os transatlânticos, e foi viver temporariamente no Umarizal, bairro na região central de Belém. Na casa de parentes, ela e o filho precisam dividir um quarto. Uma pessoa dorme na cama e outra, no colchão.

Quarto que Simone está dividindo com o filho

Álbum de família

Universitário, o filho se aproveitou das férias decretadas durante a COP. Já ela está enfrentando o trânsito diário de carro. Ainda assim, a funcionária de uma loja de ferramentas diz que está "muito feliz" com sua decisão.

O apartamento foi alugado para visitantes japoneses que participam da conferência. Ela diz que não chegou a planejar o aluguel, mas que surgiu como uma oportunidade. Ainda assim, não foi simples.

— A negociação foi muito longa, desde maio, com várias rodadas até chegarmos ao preço que todos aceitavam. Foi válido, porque deu para pagar algumas dívidas — conta Simone, cuja maior preocupação era o estado em que seu imóvel seria devolvido.

Outra dificuldade no processo foi adequar sua própria casa às condições impostas pela ONU para que o imóvel pudesse ser lançado na plataforma oficial de hospedagem da COP30. Simone precisou trocar a porta, colocar fechadura eletrônica e até comprar um colchão específico, conforme exigência.

Além de ter ganhado dinheiro próprio, ela celebra o legado do evento para a cidade:

— Estou muito feliz por termos esse evento tão grandioso em nossa cidade e pelo legado que vai ficar.

A arquiteta e funcionária pública Valeria Barros tentou alugar seu apartamento por muitos meses, seja em plataformas ou via corretores. Na semana da cúpula de líderes, pré-COP, ela já estava sem esperanças até que, às 23h da sexta-feira, dia 7, um corretor lhe telefonou com a notícia de que havia interesse para iniciar o período de aluguel em dois dias. Assim, ela, o marido e os dois filhos jovens correram para se mudar.

Valeria deixou sua casa assim que conseguiu alugar para participantes da COP30

Álbum de família

— Aceitamos, e foi uma correria para retirar tudo o que não dava para ficar, comprar lençóis e toalhas novos. O plano seria ir para a casa de praia, mas o trabalho, que antes seria somente home office, já estava em parte presencial, e inclusive com trabalho na COP. Então, minha sogra que foi para a casa de praia e ficamos na casa dela — explica Valéria.

Com a demora para acertar um aluguel, ela só conseguiu contrato no valor de um terço do que ela pretendia. Os inquilinos são africanos, falam inglês, mas o idioma vem sendo uma barreira, afirma. O corretor imobiliário costuma ligar para seus filhos pedindo ajuda nas traduções.

— Mas todos aceitaram, e agora estamos vivendo uma nova realidade. Não está sendo fácil porque altera toda a rotina, principalmente por estarmos trabalhando — admite Valéria.

Já o impacto para a advogada Angelica Maués foi menor. Ela já trabalha com hospedagem por temporada em Belém. Há mais de um ano, aluga um imóvel próprio por meio de plataformas, além de administrar outros. Assim, foi natural alugá-lo para a COP30, ainda mais porque o apartamento fica muito perto do centro de conferências, onde as diárias variam entre R$ 5 mil e R$ 10 mil. Em março, o contrato já estava fechado com um grupo de executivos de um banco.

Para Angelica, alugar sua casa na COP30 só fez bem: está com a família passando uma temporada na casa de praia

Álbum de família

Meses depois, decidiu alugar seu próprio apartamento, o que ainda não tinha feito. Por não ser tão perto da sede da COP, apesar de em bairro nobre, a diária girou em torno de R$ 4 mil.

— Quanto mais se aproximou da data do evento, mais imóveis foram ofertados em plataformas e corretoras, então, o valor das diárias caiu um pouco — explica Angelica, que se diz positivamente impactada pela COP em Belém. — É um evento de importância global e acaba expondo a nossa cidade em uma “vitrine” mundial. Já ouvi de várias pessoas que vieram participar do evento que pretendem voltar com mais disponibilidade de tempo, para conhecer mais a cidade e outras regiões do nosso estado, que é lindo. Isso me deixa imensamente feliz e orgulhosa.

A família de Angélica — marido, três filhos e um cachorro — está passando esse período no apartamento que eles têm na praia de Salinópolis, no nordeste do Pará. A experiência tem sido muito boa, diz ela:

— É um lugar que amamos, porque podemos viver dias à parte da nossa rotina e praticando kite surfe, que é o esporte que faço com meu marido.

Segundo Angélica, Salinópolis está um pouco mais cheia que o habitual para essa região. Mas o que mais chamou sua atenção foi a quantidade de gente viajando para os EUA.

— Como muitas pessoas conseguiram ter um bom retorno dos aluguéis, eu te digo que umas 30 famílias, pelo menos, do meu círculo social, optaram por viajar para os EUA.