COP30: meta de adaptação encolhe quase à metade e perde clareza

 

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Destacada entre as prioridades do Brasil, a agenda oficial de adaptação chega aos momentos finais da COP30 desidratada. O texto de negociação proposto pela Presidência da COP30 fez uma redução de 41% dos indicadores da chamada Meta Global de Adaptação (mais conhecida pela sigla em inglês GGA). Eles passaram de 100 para 59, muitos dos quais dúbios ou impossíveis de serem aferidos.

Mas se nem isso for aprovado pelos países, será o fracasso de uma agenda transformada pelo próprio clima de urgência em sobrevivência, alertam cientistas e observadores. Mesma fraca, uma meta daria peso político global à necessidade de adaptação. Pouco é melhor do que nada.

A GGA nada mais do que é a regra do jogo para medir a adaptação do mundo, saber o que funciona e deve ser replicado. Se cada país reportar do jeito que considerar melhor, ela perde o sentido.

— Se sairmos de Belém sem nada, será um fracasso. De início, estávamos confiantes. Certos de que os países entenderiam que há muita gente morrendo em decorrência da falta de adaptação, sobretudo nos países pobres. Mas não é isso que estamos vendo. Ainda assim, é melhor ter um texto enfraquecido de que nada sobre o tema mais urgente dessa COP — afirma Juliana Ribeiro, membro do painel de 78 especialistas globais selecionados pela ONU para definir os indicadores da Meta Global de Adaptação.

Ribeiro, que é gerente de projetos da Fundação Grupo Boticário e especialista em soluções baseadas na natureza, destaca que os 100 indicadores foram resultado de um ano de trabalho de especialistas convocados pela ONU. De início passavam de 5.000. Número tão elevado quanto são os problemas a tratar. E foram reduzidos numa madrugada a 59.

Tiveram mudanças importantes, por exemplo, indicadores da magnitude da saúde e da pobreza. Em saúde, por exemplo, a incidência de doenças infecciosas sensíveis ao clima (é o caso da dengue, por exemplo) poderia ser usada para avaliar o resultado de ações de adaptação.

Especialistas dizem que isso é um erro, dentre outros motivos, porque essas doenças flutuam em função do próprio clima e não necessariamente de adaptação. Anos menos quentes e chuvosos podem ter menos dengue, mas isso não significa que medidas de adaptação foram tomadas.

_ Da forma como ficou, vai ser difícil medir qualquer avanço. Essa reformulação impede o grande objetivo da GGA que era a aferição dos avanços de adaptação pelos países _ enfatiza Ribeiro.

Cientista sênior de clima da ONG americana União dos Cientistas Conscientes, fundada no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), Astrid Caldas diz que o texto não tem clareza, nem direção.

_ Alguns parágrafos se contradizem. E não se fala em como continuar o trabalho daqui para frente. Mudaram os indicadores sem consultar os técnicos. Perderam as métricas. Na prática, o texto diz que tudo é voluntário, cada um faz como quiser e nem será usado para se comparar com outros países _ lamenta Caldas.

Natalie Unterstell, presidente do Instituto Talanoa, diz que há correções a serem feitas. Mas frisa a importância de adotar indicadores sem atraso.