
Censo 2022: só um a cada 60 brasileiros usa trem ou metrô como meio principal para trabalhar, e metade vai de carro ou moto

Apenas um em cada 60 habitantes adota trens e metrô como meio principal para ir ao trabalho, apontam os dados do Censo 2022 divulgados nesta quinta-feira pelo IBGE. O automóvel é o transporte em que a população mais passa tempo no caminho para o serviço no Brasil. O levantamento mostra a prevalência dos veículos individuais motorizados no país: quase metade (48,7%) passa a maior parte da duração do trajeto em carros ou motocicletas — com maior proporção entre habitantes do Centro-Sul do país, entre brancos e amarelos, e ainda mais conforme se eleva o grau de escolaridade.
De forma inédita, o Censo 2022 traz um raio-x do modo como os habitantes se deslocam para o trabalho. No questionário, o IBGE incluiu a questão sobre o meio de transporte que o habitante passava mais tempo no deslocamento para o trabalho, ainda que ele utilizasse mais de um meio no percurso. Se a pessoa caminhava 20 minutos e ficava mais meia hora num ônibus, entraria para a conta do coletivo; mas, se ia de motocicleta por meia hora até um ramal de trem, dentro do qual passava 15 minutos, seria considerada entre aqueles cujo meio principal é a moto.
Segundo o novo Censo, 22,6 milhões de habitantes — quase um terço (32,3%) dos residentes no país — passam mais tempo dentro um carro a caminho do serviço em relação a outros modais, como os coletivos. Os ônibus são o segundo meio mais adotado, enquanto os de alta capacidade, como metrô e trens, representam 1,6%, proporção é semelhante à do uso de vans, peruas e afins (1,4%).
O Rio de Janeiro é o estado do país em que os habitantes mais utilizam o transporte público: 4,8% adotam como meio principal os trens e o metrô; 35,8%, os ônibus; e 1,8%, o BRT ou ônibus de trânsito rápido.
No geral, veículos do tipo BRT ou de trânsito rápido foram os principais meios de deslocamento de somente 0,3% dos deslocamentos, atrás até das distâncias percorridas por caminhonete ou caminhão adaptado (0,4%), os Pau de Arara.
O levantamento apontou que o ônibus é o segundo meio mais utilizado no Brasil, por 14,9 milhões de pessoas, pouco mais de um quinto da população (21,4%).
Na sequência, vêm os deslocamentos a pé (17,8%) e por motocicleta (16,4%) — 12,4 milhões de pessoas caminham para o serviço e 11,4 milhões se transportam pelo motorizado de duas rodas.
Juntos, esses quatro meios de transporte representam 87,9% do deslocamento para trabalho no país.
Para Mauro Pinheiro, analista da pesquisa, o quadro de prevalência de carros e motos indica um descompasso na oferta de transporte público pelo país e apresenta desafios para o planejamento urbano e medidas de enfrentamento a efeitos danosos ao meio ambiente e à saúde dos usuários.
— Os de alta capacidade são restritos dentro das cidades brasileiras, minimamente mais relevantes no Sudeste. Cidades como Manaus, de 2 milhões de habitantes, não têm metrô nem trem. Essa estrutura não se justifica em qualquer contexto, mas existem diferenças regionais. Em Brasília, embora seja mais nova que outras grandes, o automóvel é bastante predominante. A capital foi um símbolo dessa ideia do carro como um objeto de liberdade, mas hoje, no século 21, é um desafio pelos efeitos deletérios do excesso, com impactos na qualidade de vida, na saúde, nos níveis de poluição — disse.
O Censo destaca que o automóvel como principal meio de ida ao trabalho é opção de quase metade dos trabalhadores da Região Sul (45,9%) e mais de um terço deles no Centro-Oeste (38,8%) e no Sudeste (33,2%). Na análise por estado, Santa Catarina tem a maior proporção de habitantes que passam mais tempo em carros até o trabalho (48%). Os menores níveis foram identificados no Pará (16,3%), no Maranhão (17,2%) e no Ceará (19,3%).
Embora não seja o prevalente, o carro também é onde passa mais tempo um quinto das pessoas que trabalham no Norte (21,8%) e no Nordeste (21%). Nessas regiões, predomina o uso de motocicletas para ir trabalhar (28,5% e 26%), mais de dez pontos percentuais acima da média nacional. Em Rondônia e no Piauí, por exemplo, essa diferença do cenário Brasil chega a 25 pontos, com 42% da população adepta das motos para ir trabalhar.
O IBGE destaca que é "expressivo" o deslocamento por meios não motorizados até o trabalho, que varia conforme as regiões do país. Se no Nordeste a soma dos que passam mais tempo a caminho do serviço andando ou na bicicleta chega a 30,4%, isso é menos comum no Centro-Oeste (18,8%). Os dados mostram que os habitantes passam mais tempo em deslocamentos a pé na Bahia, em Alagoas e em Pernambuco. Já a bicicleta é mais presente no Amapá, no Acre e em Mato Grosso do Sul.
O Norte, por sua vez, é o único estado com expressão em deslocamentos por via marítima — 100,8 mil pessoas utilizam principalmente embarcações de pequeno porte, para até 20 pessoas, diz o Censo. Essa participação é maior no Amazonas, no Pará e no Amapá.
As regiões de Manaus e Belém destoam de outras concentrações urbanas da Região Norte, que registram alto uso de motocicletas. Na capital do Amazonas, o ônibus ganha relevância de 41,4%, e de 37,2% na capital do Pará. Os coletivos, porém, têm maior proeminência na Região Sudeste, com 26,6%.
— As concentrações urbanas de Manaus e Belém se diferenciam de outras do Norte por ter mais ônibus no deslocamento. Isso é importante porque Belém vai ser a sede da COP30, vai discutir questões ambientais, e isso é um dado sensível para esses debates de impactos no ambiente, na saúde, na qualidade de vida — destaca Pinheiro.
Aliás, o Rio de Janeiro é o estado que mais utiliza ônibus (35,8%), o BRT ou o ônibus de trânsito rápido (1,8%) e o trem ou o metrô (4,8%).
Cor e renda
Os dados do Censo 2022 mostram que a população de cor ou raça branca no país usa predominantemente o carro (42,9%) para ir ao trabalho, à frente de ônibus (17,6%), a pé (15,7%) e motocicletas (13,6%). Das pessoas que passam mais tempo até o serviço em automóveis, 59% eram brancas — mais de 26 pontos percentuais acima do segundo grupo que mais o usava, os pardos (32,9%). Mas, em termos relativos, a população de cor ou raça amarela foi a mais adepta ao transporte por carros e a única no Censo 2022 em que mais da metade (56,1%) citou esse meio como principal.
Os trabalhadores pretos, por sua vez, se deslocam sobretudo por ônibus (29,5%). O uso do carro é o segundo meio de transporte deste grupo (21%), mas numa proporção semelhante à dos deslocamentos a pé (19,8%) para o trabalho.
O Censo 2022 mostrou ainda que, quanto mais alto o nível de instrução dos trabalhadores, maior também o uso de automóveis, trens, metrô, táxis e veículos afins. Conforme crescia o nível de escolaridade dos habitantes, baixava os números de transporte a pé, por bicicleta e por pau de arara.
Segundo o IBGE, mais da metade (57,8%) dos trabalhadores com nível superior completo utilizava carro para se deslocar ao trabalho em 2022. A porção era ainda maior (68,1%), de quase dois terços, entre os graduados que adotavam como transporte principal algum veículo individual motorizado, incluindo motocicletas. Já entre as pessoas sem instrução ou com fundamental incompleto, apenas 18,9% adotava o automóvel e 37,1%, os individuais motorizados.
Os dados mostram que, conforme vai crescendo a escolaridade, mais tempo em ônibus passa o habitante. Esse número cai drasticamente, quando o mesmo habitante se forma no Ensino Superior.
— Existe uma correlação evidente. Quanto maior a renda da pessoa, quanto maior o nível de instrução, maior a probabilidade do uso do automóvel. É um transporte mais caro, exige renda compatível para custear a manutenção, então ele acaba também sendo proporcionalmente mais relevante entre pessoas de nível superior, que estão mais vinculadas a ganhos mais altos. Em sentido contrário, quanto mais baixa a instrução, mais provável a pessoa usar o ônibus e a moto, que é mais barata que o carro. Essas clivagens mostram os desafios da mobilidade, mas também as desigualdades nas cidades e em âmbitos regionais — analisa Mauro Pinheiro.