Barboza fala sobre temporada irregular do Botafogo, sonho de disputar Copa em 2026 e diz: 'Quero ser o maior zagueiro da história do clube'
Campeão da Libertadores e do Brasileirão como melhor zagueiro do país e do continente em 2024, Alexander Barboza quer mais. Em entrevista exclusiva ao GLOBO, o defensor argentino naturalizado uruguaio falou sobre os sonhos futuros no Botafogo, do desejo de disputar a próxima Copa do Mundo, a sensação de nostalgia ao revisitar as conquistas passadas e o que deu de errado para a equipe nesta temporada.
Como é a sua relação com o Rio de Janeiro? O que mais curte fazer?
Gosto muito de Angra (dos Reis). Temos um amigo lá que tem barco, então vou com a minha família, quase sempre também com o Mateo (Ponte, lateral do Botafogo) e outros companheiros. Também gostamos demais da comida do Rio e da noite. Quando temos tempo, nós curtirmos.
Em Buenos Aires você tem a milanesa como prato preferido. Até foi homenageado pelo restaurante. E no Rio, o que mais gosta de comer?
A picanha aqui é muito boa. Lá na Argentina tem, mas são outros cortes de carne os melhores. Aqui gosto muito da picanha com arroz e feijão. Mas meu restaurante preferido aqui é argentino (risos). Pobre Juan.
Você é argentino naturalizado uruguaio. Ainda nutre esperança de ser convocado por alguma dessas seleções?
A Argentina tem um grupo muito mais fechado, já conseguiram três ou quatro taças. Então, os jogadores novos que se somam ao projeto são com idade entre 18 e 25 anos. Eu já tenho 30, é um pouco mais difícil. No Uruguai não tem tantos jogadores como na Argentina. Acho que tenho possibilidades de ser convocado. Infelizmente, quando estávamos voando ano passado, eu ainda não tinha documentos para ser uruguaio. Só consegui esse ano, tinha muita expectativa, e não aconteceu. Ainda tem um tempo até a Copa do Mundo, então muita coisa ainda pode acontecer.
As tatuagens de Barboza com homenagens aos familiares
Alexandre Cassiano
O que aconteceu para o Botafogo não ter conseguido o mesmo sucesso de 2024 nesse ano?
O primeiro é que sempre quando um clube ganha títulos, é muito difícil manter o nível. Esse é o principal. Não é fácil. Eu gosto muito da mentalidade do Palmeiras. Todo ano eles tentam brigar por tudo. Não somente os jogadores, mas o técnico e a presidente também. A mentalidade deles é ganhar, ganhar e ganhar. Ganhamos em 2024 no Botafogo, tentamos em 2025 ganhar o que jogamos, mas não deu certo. São muitas coisas pelas quais não deu certo. Obviamente que não sou eu quem vou falar isso. Sou jogador e tento dar o meu melhor dentro do campo.
Esse ano o Botafogo apostou no Davide Ancelotti como treinador. Você já o elogiou. Pode especificar como é o trabalho dele no dia a dia?
Ele tem uma ideia e um plano de jogo muito claros, que, obviamente, tentamos levar ao campo. É fácil de interpretar, e acho que não tem coisa melhor que isso. O que acontece depois é do jogo, também temos um rival que tenta jogar contra nós. Mas é difícil. Na Libertadores (contra a LDU), ganhamos aqui. Fomos jogar na altitude, perdemos. Tínhamos um plano lá, mas deu errado na execução. Sabíamos o que tínhamos que fazer, mas se você erra um passe de três ou quatro metros, fica difícil. Isso já não é do técnico. Nós, jogadores, somos os responsáveis.
Uma das metas traçadas pelo Davide foi diminuir a intensidade dos treinos. Sentiram isso?
O problema é que cada jogador é diferente. As vezes tem cinco ou seis jogadores que conseguem manter uma intensidade muito alta o treino inteiro, porque são fisicamente dotados. Nada muda no corpo. Eu sou um deles (risos). Mentira. Por outro lado, têm jogadores que estão mais velhos e não vão poder treinar 100% toda vez. Você tem 5 ou 6 jogadores. Que todo treino tem uma intensidade muito alta. Que fisicamente são dotados. E que não muda nada no seu corpo. Mas tudo isso é falado. Sei que eles diminuíram as cargas, mas o problema aqui é que se joga muito. Tem jogo a cada três ou quatro dias, então não dá para treinar. Quando jogamos a cada cinco ou seis dias, aí pode ser.
Internamente, como você tenta ajudar no dia a dia do Botafogo?
Eu sou um cara muito resenha (risos). Gosto disso. Fico o dia todo xingando e brigando com todo mundo. Pode perguntar aqui para qualquer jogador quem é o mais chato aqui, vai falar “Barboza”. Eles falam que eu preciso de um apito, porque sou o juiz no treino. E sou advogado também (risos). Me sinto bem nesse papel, sempre treinando 100% e sabendo que vou cobrar muito (dos companheiros), até porque gosto que me cobrem também. Esse é o meu papel e sou feliz nele.
Como você vê a sua temporada e a do Botafogo?
Irregular. Acho que descreve bem. Houve jogos em que fomos muito bem, como no 3 a 0 contra o Vasco, mas depois empatamos em 0 a 0 com o Vitória. Jogamos finais contra Flamengo e Racing e perdemos. Mas ganhamos do PSG e avançamos no grupo da morte no Mundial de Clubes. Depois, perdemos para o Palmeiras.
E acho que para mim é a mesma coisa. Minha mentalidade não muda, mas quando você troca de técnico e tem muitos jogadores novos, é difícil se adaptar rápido. Tem jogo a cada três dias, então não dá para conhecer todo mundo.
O quanto te incomoda receber muitos cartões amarelos?
Eu sou um cara que vai sempre para a frente. Não fico pensando se vou receber cartão ou não. Se dou um carrinho, é porque penso que vou chegar primeiro na jogada. Se a única coisa que quiserem reclamar de mim é que tomo muitos amarelos, acho que estou fazendo as coisas bem. Se reclamam que dou bote errado ou erro passes, que não tenho vontade, aí tenho que trabalhar mais. Mas eu sou zagueiro. Não vou deixar o atacante passar. Ou passa a bola ou o jogador. As duas coisas, nunca. Vão ter que se acostumar com isso.
Os jogadores pegam muito no seu pé com isso?
Muito (risos). Porque no treino eu sou igual. Não importa se é meu companheiro, se é meu amigo ou se é meu parceiro. Se eu tenho que dar bote nele para não passar na jogada ou não finalizar, vou dar. Não vou machucar, porque não sou assim. Mas eu treino 100% igual a como jogo. É a minha maneira de viver a vida. Então, acho que estou no caminho certo.
E a falta de gols? Você aparenta estar bem incomodado com isso.
Eu sempre fui um cara que fez muitos gols durante a carreira. Batia pênaltis e faltas. E parece que esqueci de tudo isso no Botafogo. Não sei o que acontece. São muitas bolas na trave, perdi gols também… Mas vai chegar. Ano passado só fiz um, mas na semifinal da Libertadores contra o Peñarol. Tenho que trabalhar para voltar a ter confiança e começar a fazer mais gols.
Você se vê como um ídolo do Botafogo?
Não sei… Quando encontro torcedores no dia a dia, o amor que eles demonstram é muito grande. Me chamam de ídolo. Eu gostaria muito de ser ídolo do Botafogo. Sei que ganhei um título inédito, que era a Libertadores, e o Brasileirão após quase 30 anos. Isso me coloca em um lugar bom, mas ainda tenho coisas para conseguir e para tentar ganhar. Não só pela idolatria, mas porque quero ser o melhor zagueiro da história do Botafogo. Mas para isso ainda falta muito. Meu próximo ano é o último do meu contrato, e não sei o que vai acontecer. Mas vou tentar dar tudo de mim no ano que vem para voltar a ganhar títulos e aí sim, ser o melhor zagueiro ou o mais ganhador, como quiserem me colocar. Mas quero ser feliz aqui, e que o torcedor seja também.
Muito se fala sobre as possíveis saídas no ano que vem. Como você está no meio disso? Recebeu propostas…
Já recebi várias propostas de clubes brasileiros, do Oriente Médio, Arábia Saudita, Catar, da Europa também... Espanha e Turquia. Mas eu quero ficar e já falei para o meu empresário qual é meu desejo. Não tenho necessidade nenhuma de ir embora daqui, nem vontade. Mas não depende de mim. Esse é o maior problema. Se dependesse de mim, eu ficaria aqui até aposentar. Mas não depende de mim. São muitas coisas que o clube tem que falar com o meu empresário, e daí em diante veremos qual é o caminho a seguir. Mas sempre falo com a minha esposa e meu empresário, e a prioridade para mim é ficar aqui. Depois, se o Botafogo quer ou não, já é outra história.
Mas já estão conversando para renovar?
Sei que estão conversando há uma semana (a diretoria e o empresário), mas também sei que não é fácil, pois têm muitos clubes interessados. Temos que ver o que o Botafogo oferece e o que eu quero. Já mostrei minha vontade de ficar, e agora é com eles.
Nessas duas temporadas de Botafogo, qual é o seu principal jogo pelo clube?
Acho que contra o PSG. Não tomei nenhum drible, não cometi faltas, não levei cartão amarelo e não perdi nenhum duelo. Ganhamos de 1 a 0, então não levamos gols. E era o campeão da Champions League. Mas a final da Libertadores é o grande jogo da minha carreira. Sempre que estou em casa sem fazer nada começo a procurar vídeos no YouTube ou no TikTok. Gosto muito de ver as reações dos torcedores do Atlético-MG (risos) e do Botafogo, os que estiveram no Nilton Santos e nas ruas.
Barboza tatuou os títulos que conquistou pelo Botafogo na coxa esquerda
Alexandre Cassiano
Se sente nostálgico?
Muito. Queria poder ganhar uma todo ano, mas não vai ter nenhuma outra como essa. Por ser em Buenos Aires, no Monumental, onde fiz quase toda a carreira pelo River Plate, então não vai ter nenhuma como essa. Era para conseguirmos esse ano, mas lamentavelmente não conseguimos. Mas o foco no ano que vem será esse. Queremos ganhar tudo.
Tem algum companheiro seu que você olhe e pense “esse cara joga muito”?
O melhor jogador que conheci no campo foi o Luiz Henrique. Não tem igual. Nunca vi outro feito ele. O que o cara fazia e desfazia era loucura. Hoje, no Botafogo, sempre falo que o Bastos é um animal. Fazemos um contra um na defesa e ele é impossível de passar. Além de forte, é muito técnico. Ele tem uma mentalidade tranquila, mas te mata. Tem jogada que você acha que ele vai tranquilo e ele te dá porrada (risos). Ele é muito forte. Gosto demais dele.
E tem um jogador novo, chegou há pouco tempo, mas acho que vai ser zagueiro de seleção: David Ricardo. É o jogador mais parecido comigo que já vi na vida. É técnico, forte, agressivo… Quer sempre ganhar. Agora estamos jogando juntos, estou ajudando ele pela direita até que ele aprenda a usar a perna direita, porque é o meu moleque (risos). Mas acho que ele está no caminho certo e daqui a pouco, se Deus quiser, vai dar um passo para a Europa.
Como começou sua amizade com Vegetti, do Vasco, e Rossi, do Flamengo? Vocês se falam com frequência?
Joguei com o Rossi no Defensa y Justicia. Nós dividíamos o quarto na concentração e saímos juntos de férias na época, para Cancún, no México. Temos relação próxima desde então. E o meu filho mais novo é da mesma escola do filho do Vegetti. São muito amigos. Depois, minha esposa conheceu a dele e também ficaram muito amigas. Por isso acabamos nos encontrando muito. Vemos os jogadores de Botafogo e Vasco nos aniversários das famílias. Somos amigos e temos uma relação muito boa. Isso é bom, mas sabemos que, dentro de campo, eu vou matar ele e ele vai me matar (risos). Mas fora somos amigos e tudo bem.
Competitivo como você é, conseguirá torcer por eles nas decisões que disputarão?
Eu não torço por ninguém. Nunca. Sou Botafogo. Depois vou dar um abraço neles e dar os parabéns, mas não torço por ninguém.
