Antônio Gois: Reprovação na rede estadual do Rio

 

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Em novembro, a rede estadual do Rio ampliou (de duas para seis), por decreto, o número de disciplinas em que um estudante do ensino médio pode ficar em dependência antes de ser reprovado. Como sempre ocorre quando se mexe nesse tema, a medida foi logo classificada como aprovação automática por seus críticos. Mas, afinal, será bom ou ruim? Em se tratando de política educacional, a resposta a essa questão quase sempre é... depende.

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Mas antes é preciso relembrar que a ineficácia da reprovação como estratégia para melhoria da aprendizagem é uma das mais contundentes evidências da avaliação educacional. E o Rio é prova disso. A rede estadual fluminense ostentava, em 2024, a segunda maior taxa de reprovação do país (13,6% dos estudantes do ensino médio), ficando atrás apenas do Rio Grande do Norte (com 13,8%). Um ano antes, em 2023, ninguém superava o Rio nessa péssima estatística.

Analisando a década, constata-se que o Rio foi, cada vez mais, ficando para trás. Entre 2014 e 2024, por exemplo, a taxa de reprovação no Brasil (considerando a média de todas as redes estaduais) caiu de 13,1% para 5,5%, uma redução de 7,5 pontos percentuais. Já o Rio ficou praticamente estagnado, variando de 15,1% para 13,6%, uma redução de apenas 1,5 ponto percentual.

Se alta reprovação resultasse em melhor aprendizagem, haveria ao menos um argumento válido a ser considerado. Mas, no geral, não é o que ocorre no mundo, no Brasil, e muito menos no Rio. A rede estadual fluminense, que é a segunda com maior reprovação no ensino médio, é também a terceira pior quando a comparação é feita considerando apenas a aprendizagem dos alunos no Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica). Nesse recorte, apenas as redes estaduais da Bahia e do Maranhão apresentam médias em matemática e língua portuguesa inferiores.

Não precisamos apelar a exemplos de países ricos para mostrar que é possível reduzir a reprovação combinando com melhoria da aprendizagem. É certo que o Brasil não tem nenhum estado com indicador de qualidade plenamente satisfatório. Mas, nas três redes estaduais com melhores médias em matemática e língua portuguesa, as taxas de reprovação são também significativamente menores do que as do Rio, caso de Goiás (1,7% de reprovação), Paraná (5,6%) e Espírito Santo (1,9%). Redes como Ceará, Piauí e Pernambuco também conciliaram nos últimos anos ganhos em ambas as dimensões.

A literatura acadêmica é inequívoca ao mostrar que a reprovação em massa é péssima estratégia de política pública, o que não significa que, em determinadas circunstâncias, pode ser benéfico a um estudante ficar retido numa série. Mas é preciso evitar a armadilha de tomar casos individuais como representativos do todo.

A decisão da rede estadual do Rio, então, foi acertada? Aqui voltamos ao “depende”. O decreto estabelece que estudantes no regime de progressão parcial deverão participar de planos especiais de estudo para recomposição da aprendizagem, organizados pelas escolas, e poderão ser reprovados posteriormente caso não apresentem desempenho adequado. A grande questão é como isso será implementado.

Obrigar um aluno a repetir toda uma série por ter sido reprovado em três disciplinas é um convite à evasão. Mas aumentar subitamente de duas para seis o número de matérias em que ele pode acumular dependência vai exigir um esforço enorme de apoio às escolas. Sem isso, mesmo uma decisão que vai na direção correta de tentar reduzir a reprovação e a evasão pode acabar prejudicando os estudantes.