Antônio Gois: A relevância do diploma

 

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“O mercado é cada vez mais exigente, mais seletivo e menos apegado aos diplomas. O diploma tem cada vez menos relevância; a competência, cada vez mais. O mercado quer saber: quais são suas habilidades — e não apenas onde você se formou.” Essa declaração foi dada pelo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, em discurso, na semana passada, num evento de anúncio de ampliação de vagas em escolas técnicas paulistas. Políticos de todos os matizes, por estarem sempre expostos e fazendo uso da palavra, com frequência cometem gafes, equívocos ou simplificações em temas complexos.

Discute-se muito — no mundo todo, e não é de hoje — se instituições de ensino estão cumprindo devidamente uma de suas funções mais relevantes, que é a preparação para o mercado de trabalho. É um debate sério, que precisa mesmo ser feito. Mas um dos riscos de simplificações como as cometidas pelo governador é de passar uma mensagem de desincentivo ao estudo. E ter um diploma, especialmente o universitário, em média, ainda faz muita diferença no mercado de trabalho. Só que alguns importam mais do que outros.

Em setembro, a OCDE divulgou seu relatório anual Education at a Glance, mostrando, mais uma vez, que o Brasil é um dos países com maiores diferenciais de renda em favor de quem possui diploma universitário. Por aqui, a renda média desse grupo é 148% superior em relação a quem completou apenas o nível médio. Na média da OCDE, a diferença é de 54%. Além de um rendimento maior, diplomados em nível superior apresentam também taxas menores de desemprego, de acordo com o IBGE.

Mas, como argumentei sobre o tema há dois meses neste espaço, o dado da OCDE não permite concluir que esse alto diferencial na renda seja somente por causa da obtenção de um diploma. Estudos recentes e feitos com uma metodologia mais precisa trazem estimativas mais realistas sobre o impacto da conclusão de uma graduação. Eles se baseiam na comparação da trajetória de trabalhadores no mercado formal que saíram de um ponto de partida semelhante, por terem notas próximas no Enem e as mesmas características socioeconômicas.

Ao fazerem esse exercício mais sofisticado, por exemplo, Fernanda Estevan (FGV) e coautores estimam que o prêmio salarial do diploma universitário é de 31% para quem fez universidade pública, e de 17% para instituições privadas. São percentuais bem menores do que o registrado na simples comparação de médias, mas ainda significativos. Só que o retorno varia muito de acordo com o curso, sendo algumas áreas de alto valor agregado, e outras com baixo ou mesmo nulo retorno. Outros estudos também concluem que a modalidade (presencial ou à distância) é relevante. Em resumo, essas pesquisas indicam que o impacto do diploma na renda do trabalho formal vai variar muito de acordo com o curso, instituição e a modalidade, entre outros fatores.

Voltando à fala de Tarcísio, não há dúvida que grandes empresas procuram, em seus processos de recrutamento, avaliar o potencial dos candidatos para além dos diplomas. Mas, em geral, elas tampouco abrem mão de determinar — até como critério de corte para facilitar a triagem dos candidatos — qual a escolaridade mínima exigida. Aliás, o próprio governo de São Paulo — maior empregador do estado — faz isso em seus concursos públicos. O diploma pode não ser suficiente, mas tê-lo em mãos ainda representa uma vantagem no mercado de trabalho.